O tabelião Aurino da Rocha Luz, do 1º Ofício de Caxias, foi denunciado pelo Ministério Público do Maranhão sob a acusação de falsificar documentos em uma transação imobiliária de R$ 3,5 milhões e de superfaturar serviços cartoriais.
As irregularidades teriam sido praticadas entre 2020 e 2022, quando Aurino, de acordo com os promotores Raphaell Aragão e Francisco Fernando Filho, teria se aproveitado de sua posição como responsável pelo cartório para benefício próprio e familiar.
A primeira denúncia, apresentada no dia 18 de junho, mira também Maura Pereira de Carvalho, ex-escrevente do cartório. O Ministério Público afirma que ambos teriam falsificado documentos públicos para reduzir o pagamento de impostos na compra da Fazenda Bacaba, com 1.281 hectares, e da Fazenda Santana, com 220 hectares. As propriedades ficam em Caxias, município localizado no Leste Maranhense.
O negócio, de acordo com a acusação, teria sido realizado pela empresa FR Agropecuária Empreendimentos e Participação Ltda, que pertence à família de Aurino. Sua esposa, Cynara Ferreira Lopes, detém 70% das cotas, enquanto suas três filhas menores possuem os outros 30%.
Na prática, apontam os promotores, Aurino atuou simultaneamente como comprador dos imóveis via empresa familiar e como tabelião responsável pela emissão dos documentos oficiais.
O Ministério Público sustenta que, embora o valor real da transação tenha sido de R$ 3,5 milhões, nas DTIs (Declarações de Transação Imobiliária), documentos públicos que o cartório emite, fundamentais para o cálculo do ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis) e das taxas cartorárias devidas, foram declarados valores muito menores.
A Fazenda Bacaba, conforme a acusação, foi declarada por R$ 448.665, quando seu valor real seria de cerca de R$ 3,25 milhões. Já a Fazenda Santana apareceu nas DTIs por apenas R$ 77.070, embora valesse cerca de R$ 400 mil.
O advogado Einstein Sepúlveda, que representa Aurino Rocha, enviou nota ao Atual7 em que afirma que o tabelião sempre pautou sua atuação pelos estritos preceitos legais, com observância rigorosa às normas jurídicas e aos deveres funcionais que regem a atividade notarial.
Já Maura Carvalho, à época escrevente autorizada do cartório, de acordo com a denúncia, teria assinado as DTIs com pleno conhecimento de que os valores subfaturados não correspondiam à realidade da transação. A reportagem não conseguiu contato da defesa da ex-escrevente.
Ainda sobre Aurino Rocha, o Ministério Público diz que, além da suposta fraude nas DTIs, o tabelião teria inserido informações falsas nas escrituras públicas (documentos definitivos de compra e venda), argumentando que os valores baixos vinham, segundo alegou, de laudo de avaliação municipal.
Os promotores afirmam, contudo, que esse alegado laudo não seria uma análise prévia dos imóveis, mas um documento gerado automaticamente pela Prefeitura de Caxias após receber as próprias DTIs supostamente falsificadas.
Nessa primeira denúncia, o MP pede indenização mínima de R$ 1 milhão por danos morais coletivos causados à sociedade, além da condenação de Aurino Rocha e Maura Carvalho por quatro práticas distintas de crime de falsidade ideológica (duas pelas DTIs falsas e duas pelas escrituras falsas). A pena prevista é de reclusão de um a cinco anos para cada crime, com aumento por ser funcionário público.
COBRANÇAS ABUSIVAS
A segunda denúncia, apresentada no dia 19 de junho, acusa Aurino Rocha de suposta prática de excesso de exação, crime previsto no artigo 316, parágrafo 2º, do Código Penal, que ocorre quando um funcionário público exige, para si ou para terceiros, valores superiores aos legalmente estabelecidos, aproveitando-se de sua função pública.
A pena prevista é de reclusão de 2 a 12 anos para cada crime, além de multa. O MP maranhense aplicou o instituto do crime continuado, previsto no artigo 71 do Código Penal, considerando que os delitos teriam sido praticados nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, o que pode resultar em aumento de pena de um sexto a dois terços.
De acordo com o Ministério Público, o tabelião do 1º Ofício de Caxias teria cobrado emolumentos (taxas cartoriais) acima da tabela oficial em 12 situações diferentes. O valor total dos prejuízos apurados seria de R$ 43.076,15. As vítimas, aponta a acusação, seriam pessoas físicas e empresas que buscaram serviços no cartório.
As irregularidades foram identificadas em inquérito policial instaurado pela 2ª Delegacia de Investigação de Crimes de Corrupção e Fraudes, a DICRIF, da SECCOR (Superintendência Estadual de Combate à Corrupção), braço da Polícia Civil do Maranhão.
Entre as práticas abusivas identificadas estão supostas cobrança de emolumentos acima da tabela oficial, taxas indevidas por comunicações centrais sem justificativa legal, superfaturamento em averbações (anotações que atualizam informações nos registros de imóveis) e cobrança de emolumentos sem respaldo na legislação.
A investigação revelou, aponta a denúncia, que as cobranças abusivas não teriam sido casos isolados, mas um padrão sistemático de conduta de Aurino Rocha. O Ministério Público diz ter identificado que o tabelião utilizava diferentes estratégias para majorar indevidamente os valores cobrados dos usuários.
Em muitos casos, havia cobrança de diligência rural indevida, aplicação de percentual de cobrança superior ao permitido para determinados valores de imóveis, ausência de correspondência entre os valores cobrados e os previstos na tabela de emolumentos vigente na época, e cobrança de itens não correspondentes aos atos efetivamente praticados.
O Ministério Público pede a condenação de Aurino e indenização por danos morais coletivos no valor mínimo de R$ 1 milhão, considerando a gravidade das condutas e o impacto na confiança do serviço público notarial. Os valores seriam destinados ao Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos ou outro fundo de interesse social indicado pela Justiça.
OUTRO LADO
A defesa do tabelião diz que todos os fatos serão devidamente esclarecidos no decorrer da tramitação processual, com total transparência e respeito ao devido processo legal.
“Prova da retidão de sua conduta é que, em um dos procedimentos investigatórios instaurados, o próprio Ministério Público requereu o arquivamento dos autos, reconhecendo a inexistência de qualquer prejuízo ao erário público, seja na esfera tributária ou fiscal”, argumenta.
Segundo o advogado Einstein Sepúlveda, Aurino tem sido alvo de uma campanha orquestrada de difamações e calúnias, promovida por interesses contrariados de atores locais influentes no município de Caxias. “Esses agentes vêm se utilizando de fatos repetitivos, acusações infundadas e falsas narrativas criminais para tentar macular sua reputação e abalar sua credibilidade. Trata-se de um típico caso de lawfare, expressão que designa o uso instrumental do Direito como forma de perseguição política e institucional”, afirma.
“Há inúmeros elementos de defesa a serem oportunamente demonstrados perante o Poder Judiciário, razão pela qual temos plena convicção de que tais acusações serão integralmente rechaçadas pelas instâncias competentes”, completa.
A reportagem enviou mensagem para Maura Carvalho, mas não obteve retorno.
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