A pedido do vice-governador Felipe Camarão (PT), um desembargador e uma juíza do Judiciário do Maranhão censuraram o blog Maranhão Metrópoles em decisões liminares que ordenaram a retirada de uma publicação que mostrava falas atribuídas ao petista com teor misógino, machista e sexista.
A publicação, do blogueiro Victor Landim, trazia uma conversa do próprio autor com Camarão, no aplicativo de mensagens WhatsApp, sobre um discurso que a deputada Mical Damasceno (PSD) fazia na tribuna da Assembleia Legislativa maranhense, no dia 7 de maio.
Suposta captura de tela da conversa mostra que, ao saber que era alvo de críticas pela parlamentar, o vice-governador teria respondido ao blogueiro afirmando que “até a voz dela é feia” e que “parece histeria”. “Imagina comendo essa doida? Eu não fodo essa doida não kkk. Porque deve gemer e gritar feio. Até a voz dela é horrível”, teria dito Camarão, em comentários sistemáticos que reduzem a parlamentar a um objeto sexual, a desqualifica como mulher em exercício político e discrimina uma representante eleita da bancada feminina na Alema através da humilhação baseada no gênero da vítima.
Reeleita em 2022 com 52.123 votos, Mical está em seu segundo mandato e tem forte apoio no segmento evangélico, defendendo pautas conservadoras.

Diante da repercussão, o petista emitiu nota repudiando a publicação sobre as mensagens e se solidarizando com a deputada. Também registrou boletim de ocorrência contra Victor Landim, acusando o blogueiro de falsificação de documento particular, calúnia, injúria e difamação, e ingressou na Justiça pedindo a censura da publicação. Ao Judiciário, ele solicitou a retirada imediata do conteúdo do ar, proibição de divulgação de outras conversas pelo blogueiro e que a decisão fosse estendida para qualquer outro veículo de comunicação que noticiou o assunto.
Em ordem expedida no dia 17 de maio, o desembargador Joaquim Figueiredo, atuando no plantão judiciário do Segundo Grau, derrubou negativa do plantão de primeira instância e decidiu em parte a favor do petista. Ele determinou apenas a remoção do texto publicado na internet e proibiu que outras diálogos com Camarão fossem revelados pelo blogueiro, sob pena de multa diária de R$ 2 mil, caso a medida não fosse cumprida.
Em sua decisão, Figueiredo considerou o dever da imprensa de informar e o direito da sociedade à informação de interesse público, mas atribuiu maior relevância ao fato de que, “independentemente da veracidade” das mensagens, Camarão – autointitulado herdeiro político do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino, ex-governador do Maranhão (2015-2022), de quem foi secretário de Educação por mais de seis anos – é pré-candidato ao Palácio dos Leões em 2026, o que tornaria sua imagem pública mais suscetível a danos em período pré-eleitoral.
“O caso dos autos não é diferente, em tratando, a espécie, de pessoa pública, pela própria natureza do cargo que exerce, para tanto sopesada, também, a provável natureza eleitoreira das postagens objurgadas”, escreveu, comparando com o julgamento de processo semelhante ao caso pelo Tribunal de Justiça de Ceará.
No dia 3 de junho, a juíza Ariane Mendes Castro Pinheiro, da 13ª Vara Cível de São Luís, seguiu a mesma linha de censura imposta por Figueiredo, determinando tanto a remoção do conteúdo, inclusive de redes sociais do Maranhão Metrópoles, quanto a proibição de nova publicação pelo blogueiro sobre o assunto, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.
Na decisão, obtida pelo Atual7, a magistrada diz que “tal urgência se acentua ao considerar sua condição de Vice-Governador do Estado do Maranhão e pré-candidato ao cargo de Governador, o que torna sua imagem pública particularmente sensível a ataques desta natureza, especialmente em período que antecede o pleito eleitoral, com risco de dano de difícil reparação”.
A publicação, intitulada “Felipe Camarão comete violência de gênero a todas as mulheres quando ataca com fala machista e sexista a deputada Mical”, foi retirada do ar pelo blogueiro.
O caso está sob sigilo, a pedido de Felipe Camarão, e o mérito ainda será julgado.
Ao Atual7, o vice-governador alegou a ocultação ocorre porque ele não quer “tornar isso um espetáculo”. “Adotei e adotarei todas as medidas jurídicas necessárias. Mas sem expor a deputada, a mim mesmo ou nossas famílias. Não vou fazer debate ou uso político desses fatos”, respondeu, sem explicar como a restrição ao debate público se justifica em caso envolvendo violência política de gênero contra parlamentar eleita e com a transparência esperada de gestores públicos.
“Quem deve ser responsabilizado é quem publicou / fabricou”, disse.
Em meio à decisões de censura obtidas no Judiciário estadual, o vice-governador maranhense enfrenta na Assembleia Legislativa uma representação para que seja retirado do mandato devido às falas misóginas, machistas e sexistas atribuídas a ele. Assinam o documento o advogado Warllyson dos Santos Fiuza e o subtenente militar da reserva, Fabiano dos Santos Brandão, na condição de cidadãos.
O pedido de impeachment, que acusa Camarão de possível crime de responsabilidade, foi protocolado em 28 de maio, dois dias após relatório preliminar da Polícia Civil do Maranhão apontar, após perícia no celular do blogueiro, que as mensagens com teor misógino, machista e sexista são autênticas.
Vítima das agressões, a deputada tem se manifestado publicamente pela retirada do petista do cargo, caso ele próprio não renuncie ao mandato. “O que está em jogo aqui não é só a minha honra, é a liberdade, a transparência, é o direito do povo maranhense de saber quem verdadeiramente ocupa o Palácio dos Leões”, defendeu.
Após a divulgação do laudo pericial confirmando que as mensagens são autênticas e foram extraídas diretamente do WhatsApp instalado no celular do blogueiro, a parlamentar reforçou os pronunciamentos pelo impeachment do vice-governador.
“O que era dúvida para alguns, agora é fato incontestável. Felipe Camarão, as palavras que você proferiu a mim não atingiram apenas a Mical Damasceno, elas agrediram todas as mulheres do Maranhão”, afirmou.

A representação está sob análise na presidência, comandada pela deputada Iracema Vale (PSB).
Pelas regras internas do Assembleia Legislativa, após confirmados requisitos formais, a parlamentar deve enviar a documentação ao vice-governador, para que preste informações dentre do prazo de 15 dias. No mesmo prazo, uma comissão especial precisa ser criada, constituída de um quinto dos membros da Alema, para emitir parecer sobre o caso.
A manifestação do colegiado também precisa ser feita em até 15 dias, a contar da data de sua instalação. Contudo, como a Casa entra em recesso no dia 17 de julho, não haveria tempo para conclusão do caso até o início do próximo semestre.
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