Homem sorrindo, vestindo terno azul e gravata cinza, em ambiente interno

Irmãos, esposas, filhas, cunhadas, noras e até padrasto de prefeito, secretários e vereadores de Buriticupu ganham cargos na prefeitura

Ministério Público investiga nomeação sistemática de parentes na gestão João Carlos. Há suspeita de que parte seria servidores fantasmas

O Ministério Público do Maranhão apura, em diversas investigações, suspeitas de nepotismo e loteamento de cargos públicos em Buriticupu, município no Oeste Maranhense, a 410 quilômetros de São Luís.

O suposto uso da estrutura administrativa da prefeitura para aparelhamento familiar envolveria parentes do prefeito João Carlos (PP) e de secretários, vereadores e outras autoridades públicas do município.

São irmãs, esposas, filhos, cunhadas, noras, enteado e sobrinho. Até o padrasto-sogro do chefe do Executivo municipal ganhou cargo na prefeitura. Parte dos nomeados seria ainda servidores fantasmas, segundo a investigação.

A Constituição veda o nepotismo. A prática ocorre quando um agente público usa de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer parentes até o terceiro grau. Os graus são calculados a partir da relação direta ascendente ou descendente (pais e filhos) ou por afinidade (cônjuges, cunhados).

A Súmula nº 13 do STF (Supremo Tribunal Federal) consolidou essa proibição, enquadrada também na Lei nº 14.230/2021, conhecida como nova Lei de Improbidade Administrativa.

Para configurar improbidade, é necessário comprovar dolo específico, que ocorre quando há comprovação de vontade livre e consciente do gestor público em praticar a conduta para alcançar resultado ilícito ou violar princípios da administração pública. As sanções incluem multa civil, proibição de contratar com o poder público e perda da função pública.

PARENTES DO PREFEITO

De acordo com apuração conduzida pelo promotor de Justiça Felipe Augusto Rotondo, levantamento preliminar identificou mais de 30 casos de possível nomeação de parentes de integrantes da gestão municipal.

Três foram identificados como parentes do prefeito: a cunhada Elines Santos Silva, nomeada para o cargo de coordenadora do Protocolo Central; o padrasto José Cardial Pereira, também sogro de João Carlos, no cargo de coordenador Pedagógico de Educação no Campo da Secretaria Municipal de Educação, e o irmão Clavy Serafim da Luz Silva, colocado em um cargo de terceiro escalão na Secretaria de Fazenda e Orçamento. Após denúncia ao Ministério Público, apenas esse último foi exonerado.

A investigação identificou ainda uma possível ligação de parentesco entre Francisco Martins Cunha, nomeado para o cargo de coordenador de Acompanhamento e Distribuição de Alimentação Escolar, e a deputada estadual Edna Silva (PRD), esposa do prefeito João Carlos.

SECRETÁRIOS CONCENTRAM FAMILIARES

A concentração de parentes é ainda maior entre os secretários municipais.

Joelda Torres Medeiros, titular da pasta de Comunicação, possui quatro familiares nomeados: a irmã Joselda Chagas Torres, os filhos Ludmilla Diana e Ricardo Augusto Torres Medeiros, além da nora Gabriela Souza Medeiros.

O secretário de Administração e Planejamento, Vander Cleber Freitas Silva, tem a esposa Luzabel da Silva Freitas como diretora do Departamento de Patrimônio e Tombamento. Também tem nomeada a filha Luanne da Silva Freitas (engenheira contratada por chamamento público), a cunhada Luisa Ribeiro da Silva Leal (coordenadora do Programa Saúde na Escola) e o enteado Danilo Alves da Silva (diretor da Frota).

Em alguns casos, casais ocupam secretarias diferentes na mesma gestão. O secretário interino de Infraestrutura, Lucas Rafael da Conceição Pereira, é casado com Edyane Cristiny Lima Lopes, secretária de Desenvolvimento Social, Trabalho e Economia Solidária.

A investigação também apura se Lissandra Tarssia Silva Barreto, diretora do Centro de Especialidades Médicas, tem parentesco com a secretária de Saúde Christiane Piancó Lima.

Quem também tem parentes nomeados na prefeitura, ainda de acordo com a apuração, é o secretário de Articulação Política, Valderi Silva Torres. São pelo menos quatro irmãos: Edilson (coordenador de Almoxarifado), Maria das Graças Lima Torres (professora), Maria dos Remédios Silva Torres (coordenadora do Programa Saúde na Escola) e José Almir Silva Torres (professor).

Já o secretário de Meio Ambiente, Josias da Silva Costa, e a secretária de Habitação, Vera Lucia Santos Costa, têm nomeados conjuntamente três parentes: Jocilda da Silva Costa (irmã de Josias, professora), Kamila de Sousa Alves (nora de ambos, coordenadora de Esportes na Educação) e Thiago Felipe Costa Sousa (sobrinho de ambos).

Outros secretários também têm familiares nomeados: Paulo de Melo Sousa (assessor na Educação) é irmão do secretário de Esportes Wilas de Melo Sousa; Jéssica Moura Vieira Lima (assessora especial) é esposa do secretário de Agricultura Marcos Almeida Lima; Marcelo Nobre da Silva (coordenador de Eventos) é irmão do secretário de Cultura Mateus Nobre da Silva.

Ainda segundo as investigações do Ministério Público, Natanael Valero Martins, nomeado professor na escola Sara Kubitschek, é irmão dos secretários de Indústria (Eurandino Valero Martins) e de Transparência (Magdonel Valero Martins).

VEREADORES TAMBÉM TÊM FAMILIARES COM CARGOS NA PREFEITURA

O suposto aparelhamento familiar se estende ao Legislativo municipal de Buriticupu.

De acordo com o Ministério Público, o vereador José Everton Nunes Araújo e seu irmão, o secretário de Segurança Frank Eron Nunes Araújo em um caso que envolve duas mulheres da família: Cidiane Ferreira da Silva Araujo (gestora escolar geral) seria esposa do vereador e cunhada do secretário, enquanto Eliziete Silva Araujo (coordenadora Pedagógica de Educação Inclusiva) seria esposa do secretário e cunhada do vereador.

Já a vereadora Sebastiana Sousa Silva tem nomeadas as duas filhas, Maria Cheila Silva Sousa e Maria Cleuzineide Silva Sousa, como coordenadoras pedagógicas do Ensino Fundamental.

Ainda segundo a apuração, também tiveram familiares emplacados na prefeitura o vereador Antonio Leandro Lima do Nascimento, com a esposa Cerlijane Lima Verdiano nomeada como gerente de Unidade Básica de Saúde, e a vereadora Vanusa Ibiapino Sousa Fernandes, com a irmã Kelly Ibiapino Sousa nomeada gestora escolar geral.

TERCEIRO ESCALÃO REPLICA PRÁTICA

A prática de nomear familiares se reproduz também em cargos de terceiro escalão.

José Victor de Freitas Costa, presidente do SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto), tem nomeada na prefeitura de Buriticupu a cunhada Adelaide Rodrigues dos Santos e a esposa, Regiane Silva Rodrigues, como professoras na Semed.

Além de Costa, o chefe de Gabinete da prefeitura também tem nomeada a esposa, Auriléia Rodrigues da Silva Batista, como diretora do Departamento de Prestação de Contas.

EXONERAÇÃO IMEDIADA E RESSARCIMENTO AO ERÁRIO

Em 22 de agosto de 2025, o promotor Felipe Augusto Rotondo expediu recomendação à Prefeitura de Buriticupu pela exoneração imediata de todos os parentes do prefeito, secretários, vereadores e demais autoridades públicas municipais nomeados irregularmente na prefeitura.

O prazo estabelecido foi de 10 dias úteis para as demissões e 30 dias para um levantamento completo dos cargos comissionados.

No mesmo prazo, a prefeitura também deve instaurar procedimento para apurar eventuais prejuízos ao erário. Os valores indevidamente pagos, segundo o Ministério Público, deverão ser ressarcidos aos cofres públicos.

Em caso de descumprimento, Rotondo advertiu que serão tomadas medidas judiciais, incluindo ação de improbidade administrativa, encaminhamento de peças criminais e busca e apreensão de documentos.

Atual7 enviou questionamentos detalhados ao prefeito João Carlos em 8 de setembro, via e-mail, sobre as investigações do Ministério Público, critérios de nomeação dos familiares na gestão municipal, mecanismos de controle de assiduidade e auditorias internas, mas não obteve resposta.


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