Celso Daniel
Marcos Valério cita Lula como mandante do assassinato de Celso Daniel
Política

Em depoimento inédito, o operador conta que o ex-presidente deu aval para pagar a chantagista que iria apontá-lo como envolvido no assassinato do prefeito

O publicitário Marcos Valério, condenado a 40 anos de prisão por ser o operador do mensalão do PT, disse em depoimento que teve a informação de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria sido um dos mandantes da morte de Celso Daniel – prefeito petista de Santo André (SP) assassinado em 2002. A revelação foi publicada pela revista Veja, que obteve o depoimento do publicitário ao Ministério Público de São Paulo.

Valério disse que a informação de que Lula teria sido o mandante do assassinato foi repassada a ele diretamente pelo empresário Ronan Maria Pinto – que participava de um esquema de propina na prefeitura de Santo André.

Segundo a reportagem, Ronan ameaçou envolver a cúpula do PT na morte de Celso Daniel, e Valério havia sido designado pelos petistas para comprar o silêncio do empresário. Ainda de acordo com o relato ao MP-SP, ele e Delúbio Soares, tesoureiro do PT à época, se encontraram em 2003 com Ronan em um hotel de São Paulo. O depoimento de Valério relata também que Ronan, nessa reunião, disse que não ia "pagar o pato" sozinho e que apontaria Lula como "mandante da morte" de Celso Daniel. Para não fazer isso, exigiu dinheiro. O pagamento, de R$ 6 milhões, teria sido feito. À época, Lula já era presidente.

De acordo com a reportagem, o promotor do MP-SP Roberto Wider, que ouviu Marcos Valério, quis saber se ele havia conversado com Lula sobre esse episódio. O publicitário disse que sim, e relatou como foi o diálogo: “Eu virei para o presidente e falei assim: ‘Resolvi, presidente’. Ele falou assim: ‘Ótimo, graças a Deus’."

Antiga cúpula do PT envolvida no assassinato de Celso Daniel

A reportagem da revista Veja informa ainda que, segundo o depoimento de Marcos Valério, não apenas Lula e Delúbio Soares estariam envolvidos a operação para não envolver petistas na morte de Celso Daniel. Diversos outros integrantes da cúpula do PT à época teriam tido alguma participação na negociação para calar Ronan Maria Pinto.

Quem teria chamado Valério para usá-lo como emissário do pagamento a Ronan foi Gilberto Carvalho – chefe de gabinete do então presidente Lula. O publicitário também citou no depoimento, como pessoas que estariam por dentro da "operação", o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira, o ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, o ex-deputado Professor Luizinho e Paulo Okamotto (ex-presidente do Sebrae no governo do PT e amigo pessoal de Lula).

Marcos Valério relatou que Okamotto certa vez o ameaçou caso decidisse contar o que sabe: "Marcos, uma turma do partido acha que nós devíamos fazer com você o que foi feito com o prefeito Celso Daniel. Mas eu não, eu acho que nós devemos manter esse diálogo com você. Então, tenha juízo".

Por que Celso Daniel foi sido executado; e a contradição de Valério

No depoimento ao MP-SP, o publicitário Marcos Valério contou que Professor Luizinho, que havia sido vereador em Santo André e que conhecia Celso Daniel, explicou que o "problema" ocorreu porque a corrupção na prefeitura tinha como objetivo financiar gastos do PT – especialmente os da campanha presidencial de Lula em 2002. Mas o esquema teria virado uma "ação de gângster".

Essa "ação de gângster" teria sido o uso de dinheiro desviado para enriquecimento de pessoas envolvidas no esquema de corrupção. Nesse ponto, há uma contradição no depoimento de Valério, pois ele diz que a informação que recebeu de Professor Luizinho era de que Celso Daniel teria sido morto porque se opôs a entregar a condução do esquema a esse grupo, que seria contrário aos interesses do PT (obter dinheiro para si).

Como o pagamento a Ronan foi feito

As investigações da Operação Lava Jato confirmaram a forma como foi feito o pagamento Ronan Maria Pinto, segundo o relato de Marcos Valério. O Banco Schahin, que recebia aportes milionárias de fundos de pensão dirigidos por petistas durante o governo do PT, "emprestou" R$ 12 milhões ao empresário José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Desses recursos, R$ 6 milhões foram usados para comprar o silêncio de Ronan. A outra metade foi entregue a Jacó Bittar, amigo de Lula e pai de Fernando Bittar – o dono oficial do sítio de Atibaia pelo qual o ex-presidente foi condenado. À Lava Jato, o banco admitiu ter feito a simulação de empréstimo a pedido do PT.

A relação entre o caso Celso Daniel e a Lava Jato não se encerra nesse ponto. Segundo a reportagem da revista Veja, Marcos Valério contou a história inteira em 2018 ao então juiz Sergio Moro.