Cloroquina
OMS suspende testes com cloroquina e hidroxicloroquina contra a Covid-19
Cotidiano

Sem respaldo científico, medicamentos foram adotados em novo protocolo da SES para tratamento de pacientes com sintomas leves da doença

A OMS (Organização Mundial de Saúde) anunciou, nesta segunda-feira 25, que suspendeu temporariamente testes com a cloroquina e a hidroxicloroquina para tratar a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus.

A decisão, anunciada por Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, foi tomada depois de um estudo publicado, na sexta 22, na revista científica The Lancet. Feita com 96 mil pessoas, a pesquisa apontou que não houve eficácia das substâncias —sozinhas ou combinadas com macrolídeos (grupo de antibióticos dentre os quais se destaca a azitromicina)— contra a Covid-19, e detectou risco de arritmia cardíaca nos pacientes que as utilizaram.

“O grupo executivo implementou uma pausa temporária do braço da hidroxicloroquina no ensaio Solidariedade, enquanto os dados de segurança são revisados pelo conselho de monitoramento de segurança dos dados. Os outros braços do ensaio continuam”, disse Tedros, na introdução da entrevista online coletiva de hoje. A decisão resultou da deliberação do grupo executivo da Solidariedade, que testa possíveis terapias contra a Covid-19.

No Maranhão, sem respaldo científico e contra parecer-técnico da comissão de especialistas da Virion Infectologia, terceirada da Emserh (Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares) responsável pela elaboração de protocolos para enfrentamento da pandemia no estado, o governo de Flávio Dino (PCdoB) decidiu produzir e distribuir kits de medicamentos com cloroquina e hidroxicloroquina para tratamento de pacientes com sintomas leves de Covid-19.

Apesar das críticas negativas, as mesmas feitas por ele próprio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que defende o uso dos medicamentos no tratamento precoce da doença, Dino manteve o novo protocolo da SES, e tentou atribuir aos médicos a decisão tomada pela sua gestão.

Procurados pelo ATUAL7 desde a semana passada, o Palácio dos Leões e o titular da SES, Carlos Lula, não retornaram o contato explicando porque não seguiram o parecer-técnico dos infectologistas e qual estudo foi utilizado para decisão anticiência.

Mesmo com comitê, Dino contrata comissão científica e ignora parecer-técnico sobre Covid-19
Cotidiano

Governo está dispensando recursos públicos com equipe privada de especialistas que a própria SES não segue a orientação

Apesar do aumento descontrolado de casos positivos e de óbitos por Covid-19 na Aglomeração Urbana de São Luís e no interior do Maranhão, o governador Flávio Dino (PCdoB) tem anunciado que deve editar, nesta quarta-feira 20, decreto autorizando a reabertura do comércio e serviços não essenciais na próxima semana, a partir do dia 25.

Além da já marcante falta de transparência e do achismo em vez da ciência na tomada de decisões para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, agora há também indícios de malversação de recursos públicos.

Embora tenha montado o Comitê Científico de Prevenção e Combate ao Coronavírus no Maranhão para auxílio na tomada de decisões para o achatamento da curva de contaminação pela doença, a gestão estadual contratou emergencialmente a empresa Guri Serviços Médicos Ltda., de São Luís, conhecida no mercado como Virion Infectologia, para realização do mesmo tipo de serviço.

Foram dois contratos, um de R$ 300 mil e outro de R$ 60 mil, ambos fechados no mês passado, por dispensa de licitação, pela Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares (Emserh), que atua como braço da SES (Secretaria de Estado da Saúde) no gerenciamento das unidades pertencentes à rede pública estadual de saúde. A vigência vai até outubro próximo.

Além do dispêndio na prestação de serviço já existente na administração pública —pelo menos em tese, já que não houve a publicização de qualquer estudo produzido pelo próprio comitê científico, desde o início da pandemia—, o governo Dino está pagando por orientação científica que ele próprio decide não seguir.

Conforme mostrou o ATUAL7, na última segunda-feira 18, um dia depois da SES haver tornado público que mudou o protocolo de atendimento para passar distribuir um kit com cloroquina e hidroxicloroquina para pacientes com sintomas leves da Covid-19, seis especialistas da Virion Infectologia apresentaram um parecer-técnico com orientações contrárias à essa nova diretriz.

“A indicação indiscriminada de CQ/HCQ para todos os casos de Covid-19, acarretaria uso massivo da droga na população. Ao incluir todos os casos leves, considerando que a grande maioria não evolui para gravidade, os riscos da droga podem sobrepujar os já incertos benefícios. Por não ser inócua, salienta-se os riscos (em especial, arritmia grave) que podem ocorrer em uma população com perfil de riscos distinto daquelas que são tratadas com a mesma droga para outras condições – idade avançada, doenças cardiovasculares e uso concomitante de outras drogas que aumentam intervalo QT (p.ex. azitromicina) e estado grave/crítico. Portanto, não se pode extrapolar a experiência de uso limitada a determinadas condições patológicas para a nova população. Além disso, uma eventual indicação precoce de CQ/HCQ enseja uma ainda maior necessidade de realização de testes confirmatórios. De outro modo, haverá prescrição irracional para condições outras que não Covid-19, dada a inespecificidade de muitos dos sintomas, expondo populações a efeitos colaterais sem indicação”, diz trecho do documento.

Respaldada em estudos científicos, após alertar sobre a ineficácia da droga no tratamento da Covid-19, a terceirizada posicionou-se contra o kit com cloroquina e hidroxicloroquina e enfatizou a necessidade das medidas restritivas de distanciamento social —contrariando a decisão de Flávio Dino pela liberação do comércio e serviços não essenciais em meio ao crescimento da curva de contaminação, mesmo após o decreto de lockdown a mando da Justiça em São Luís e outros três municípios da Região da Ilha do Maranhão.

“Nos posicionamos contra a elaboração de ‘kits’ de tratamento para Covid-19, sob pena de causar a impressão para médicos e usuários de que há um tratamento de eficácia comprovada, ou mesmo uma cura, desencadeando uma corrida às unidades de saúde”, ressaltam os especialistas em infectologia, em um dos trechos do parecer técnico apresentado à SES.

No final da tarde dessa terça-feira 19, o ATUAL7 entrou em contato com um dos responsáveis pela Virion Infectologia, Eudes Simões. Ele confirmou os serviços de consultoria científica no enfrentamento ao Covid-19, e que o novo protocolo adotado pela SES não partiu de estudos da empresa.

“Fizemos uma revisão sistemática da literatura, sobre as recomendações que existem das entidades nacionais e internacionais, e fizemos um parecer técnico, em nossa consultoria ao Estado. São seis infectologistas, ajudando o Estado a tomar decisões e organizar as atividades. Muitos dos protocolos [adotados pela SES] são do nosso grupo de Infectologia, mas esse [protocolo de distribuição de cloroquina/hidroxicloroquina para casos leves] não foi nosso”, disse.

Eudes Simões afirmou ainda que, até aquele momento, não havia recebido qualquer retorno sobre o parecer-técnico emitido pelos especialistas da Virion, e que foi surpreendido com a adoção do kit sem respaldo científico adotado pelo Governo do Maranhão.

“Só ficamos sabendo também nesse dia”, disse, referido-se ao domingo 17, data em que a agência de notícias do governo informou oficialmente sobre a distribuição do kit ter sido iniciada desde o dia 12.

Procurado, também ontem, para se posicionar sobre o parecer-técnico da equipe de especialistas que assessora a SES no combate ao novo coronavírus, o governo Flávio Dino não retornou o contato até o momento.

Integram Comitê Científico de Prevenção e Combate ao Coronavírus no Maranhão, segundo o governo estadual, os médicos Rodrigo Lopes (oncologista), Giselle Boumann (infectologista), Conceição Pedroso (infectologista), Edilson Medeiros (intensivista) e Marcos Pacheco (sanitarista). A coordenação é feita pelo secretário estadual de Saúde, Carlos Lula (advogado eleitoral), e a subsecretária estadual de Saúde, Karla Trindade (enfermeira).

A Virion Infectologia tem como sócios, segundo a Receita Federal, Raquel Melo Vieira Simões, Eudes Alves Simões Neto e Matheus Melo Lima. Os especialistas da empresa que assessoram a SES sobre a Covid-19 são: Ana Cristina Rodrigues Saldanha, Bernardo Bastos Wittlin, Elza Carolina Cruz Sousa Barros, Eudes Alves Simões Neto, Mônica Elinor Alves Gama e Conceição de Maria Pedrozo e Silva de Azevedo. Apenas esta última também integra o Comitê Científico do Estado.

Comissão de Infectologia que assessora a SES é contra kit com cloroquina para pacientes leves com Covid-19
Cotidiano

Em parecer entregue ontem 18, com base em estudos científicos, especialistas enfatizam a necessidade de distanciamento social e ampliação da testagem

A Comissão de Infectologia que assessora a SES (Secretaria de Estado da Saúde) no enfrentamento à pandemia no novo coronavírus no Maranhão posicionou-se contra o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina, com ou sem azitromicina, para casos confirmados de Covid-19 que apresentem sintomas leves e em fase precoce.

A orientação foi apresentada nessa segunda-feira 18, um dia depois do governo de Flávio Dino (PCdoB) tornar oficial —após vazamento na rede social Facebook— a mudança repentina e sem apresentação de qualquer estudo científico no protocolo de atendimento a pacientes diagnosticados com a doença.

Segundo o novo direcionamento da SES, que a própria gestão estadual afirma ter sido implementado desde o último dia 12, pacientes com sintomas leves de Covid-19 que procurarem as unidades públicas de saúde da rede estadual, se receitado pelo médico durante o atendimento, poderão receber e levar para casa um conjunto de fármacos que combinam Hidroxocloroquina/Cloroquina, Azitromicina, um corticoide, vitaminas C e D, além de remédios para febre e dores, como paracetamol e dipirona.

Para a Comissão de Infectologia, porém, além de não possuir respaldo científico, esse novo protocolo coloca a população em risco, inclusive de morte. Baixe o documento.

“Frisa-se que a maioria dos estudos não avaliou, até aqui, o emprego da droga em fases mais precoces da doença. A suposição de que a ação antiviral de uma droga tenha maior impacto clínico quando usada nos primeiros dias de sintomas, num momento de grande replicação viral, é plausível e encontra eco em outras infecções virais, como naquelas por herpes simples, varicela-zoster e Influenza. Contudo, isto não é um álibi que inverta a lógica científica e favoreça a indicação ‘até que se prove o contrário’: o ônus da demonstração recai sobre estudos que comprovem a eficácia. Ademais, estudos observacionais recentes, supracitados, desfavorecem a hipótese de que pacientes já em uso de HCQ estejam protegidos da infecção e evolução para gravidade”, diz trecho do parecer.

“A indicação indiscriminada de CQ/HCQ para todos os casos de Covid-19,
acarretaria uso massivo da droga na população. Ao incluir todos os casos leves, considerando que a grande maioria não evolui para gravidade, os riscos da droga podem sobrepujar os já incertos benefícios. Por não ser inócua, salienta-se os riscos (em especial, arritmia grave) que podem ocorrer em uma população com perfil de riscos distinto daquelas que são tratadas com a mesma droga para outras condições – idade avançada, doenças cardiovasculares e uso concomitante de outras drogas que aumentam intervalo QT (p.ex. azitromicina) e estado grave/crítico. Portanto, não se pode extrapolar a experiência de uso limitada a determinadas condições patológicas para a nova população. Além disso, uma eventual indicação precoce de CQ/HCQ enseja uma ainda maior necessidade de realização de testes confirmatórios. De outro modo, haverá prescrição irracional para condições outras que não Covid-19, dada a inespecificidade de muitos dos sintomas, expondo populações a efeitos colaterais sem indicação”, continua.

Elaborado pela Virion Infectologia, empresa contratada pela SES há cerca de um mês para auxílio em estudos relacionados ao enfrentamento à pandemia, o documento é assinado pelos infectologistas Ana Cristina Rodrigues Saldanha, Bernardo Bastos Wittlin, Conceição de Maria Pedrozo e Silva de Azevedo, Elza Carolina Cruz Sousa Barros e Eudes Alves Simões Neto, professores da UFMA (Universidade Federal do Maranhão) e integrantes do corpo médico de especialistas do Hospital Universitário da UFMA; e pela Pediatra e também professora da UFMA, Mônica Elinor Alves Gama.

Citando importantes entidades representativas de especialidades médicas diretamente ligadas ao enfrentado ao novo coronavírus, eles também concluem que, “face às evidências [científicas] mais recentes”, também devem ser retirado do protocolo pela SES a recomendação para uso da cloroquina em pacientes internados.

Em outro trecho, os especialistas reconhecem que compete ao médico, durante o atendimento e em qualquer fase da doença, “de forma responsável, individualizada e compartilhada com o paciente, mediante termo de consentimento”, prescrever o medicamento.

Contudo, alertam: “Uma vez prescrevendo, é dever ético do médico expor ao paciente de forma clara as incertezas científicas, isto é, informá-lo da ausência de eficácia comprovada, bem como seus potenciais efeitos colaterais”.

“Desta forma, nos posicionamos contra a elaboração de ‘kits’ de tratamento para Covid-19, sob pena de causar a impressão para médicos e usuários de que há um tratamento de eficácia comprovada, ou mesmo uma cura, desencadeando uma corrida às unidades de saúde”, ressaltam.

Ainda no documento, a Comissão de Infectologia que assessora a SES enfatiza a necessidade de distanciamento social —o que contraria totalmente a decisão do governador Flávio Dino de liberar, sempre sem apresentação qualquer estudo científico, a reabertura do comércio e serviço não essencial da Aglomeração Urbana de São Luís, apesar da curva de contaminação do novo coronavírus continuar ascendente.

“Estamos diante de uma pandemia sem precedentes na História moderna, que já atingiu a marca de centenas de milhares de mortes no mundo e dezena de milhares no Brasil. Como grupo de médicos infectologistas, estamos atuando direta e indiretamente no atendimento aos pacientes com Covid-19, em todos os níveis de atenção (primária, urgência e hospitalar especializada). É sob esta condição que enxergamos a necessidade de respostas urgentes para a população. Enfatizamos a necessidade de distanciamento social, a única medida por ora comprovadamente eficaz para reduzir casos e mortes. Enfatizamos a necessidade de ampliar a testagem e fortalecer a rede assistencial, em todos os níveis de atenção, a fim de identificar os casos, prescrever medidas de isolamento, monitorar sinais precoces de agravamento e ampliar a oferta de leitos. A despeito da emergência global, a adoção de medidas terapêuticas não dispensa preceitos mínimos da medicina baseada em evidência. A ciência não é supérflua neste momento, senão o meio que, por excelência, é capaz de dar as respostas urgentes e necessárias; do contrário, sob pena de serem preconizadas medidas danosas e ilusórias à população e desviar o foco dos esforços necessários. Não à toa, centenas de estudos estão sendo semanalmente publicados em todo o mundo. O conhecimento médico que pretende ser alçado à recomendação deve se basear em dados e estudos, e não em depoimentos de experiência pessoal, divulgados por canais informais”, conclui.

O ATUAL7 solicitou ao Governo do Maranhão, em e-mail enviado às secretarias estaduais de Comunicação e de Saúde, um posicionamento sobre o parecer técnico dos especialistas e aguarda retorno. Nas redes e no site institucional, sempre sem apresentar qualquer estudo, a gestão estadual afirma estar baseada em evidências científicas para a adoção do novo protocolo.

Entidades médicas se manifestam contra o uso generalizado da cloroquina, protocolo adotado pela SES
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Mesmo sem respaldo científico, governo Flávio Dino estabeleceu novo protocolo para distribuição do medicamento a pacientes com sintomas leves da Covid-19

Quatro órgãos representativos de especialidades médicas diretamente ligadas ao enfrentado ao novo coronavírus divulgaram, nessa segunda-feira 18, manifestos contrários ao uso generalizado da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento de pacientes diagnosticados com a Covid-19 antes da conclusão de estudos científicos complementares.

No Maranhão, segundo divulgado pelo governo de Flávio Dino (PCdoB), esse protocolo foi adotado pela SES (Secretaria de Estado da Saúde) para pacientes com sintomas leves da doença, desde o último dia 12, mesmo sem respaldo científico. Um kit com cloroquina/hidroxicloroquina e outros remédios foi montado pela pasta e pela Emserh (Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares) para distribuição a esses pacientes, ignorando ainda o fato de que quem apresenta sintomas leves da Covid-19 sequer é testado para detecção do novo coronavírus.

Até agora, estudos científicos não encontraram evidências de que o uso do medicamento traga benefícios para pacientes infectados pelo novo coronavírus, inclusive para aqueles com casos leves e moderados. Há, também, relatos de efeitos colaterais graves, inclusive parada cardíaca.

Um dos documentos divulgados ontem é assinado pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira, pela Sociedade Brasileira de Infectologia e pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Nele, as entidades alertam que, embora tenha acesso fácil e custo “moderado”, a droga tem benefício clínico “pequeno ou negligenciável” e nível de evidências científicas “baixo” quanto à sua eficácia.

Um outro documento, assinado pela Sociedade Brasileira de Imunologia destaca, também, que até o momento não existe terapia comprovadamente efetiva para o tratamento do novo coronavírus e que o uso desse medicamento tem efeitos colaterais que podem levar a morte de pacientes. Um parecer científico divulgado pela entidade sobre o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da doença conclui que “ainda é precoce a recomendação de uso deste medicamento na Covid-19”.

A inclusão da droga no protocolo de atendimento pelo SUS (Sistema Único de Saúde) a pacientes atingidos pelo novo coronavírus é apontada como a causa da saída de Luiz Henrique Mandetta e de Nelson Teich do Ministério da Saúde no governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Apesar das críticas e ironias diárias nas redes sociais ao presidente da República, em total confissão de falta de comando, o governador Flávio Dino tem se esquivado de suas responsabilidade e tentado atribuir aos médicos o estabelecimento da nova diretriz da SES, que serve justamente para balizar a atuação de médicos que estão na linha de frente do combate à pandemia na rede pública estadual de saúde.

Yglésio critica novo protocolo da SES sobre uso de cloroquina: ‘Falsa redução dos casos’
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Mesmo sem respaldo científico, governo Flávio Dino liberou a distribuição do remédio para pacientes com sintomas leves de Covid-19

A liberação dada pelo governo de Flávio Dino (PCdoB), desde o último dia 12, para que médicos da rede pública estadual de saúde receitem e distribuam cloroquina para pacientes com sintomas leves de Covid-19, foi criticada pelo deputado estadual Yglésio Moyses (PROS).

Embora pertencente ao grupo de deputados governistas na Assembleia Legislativa, o parlamentar, que é medico, fez uma série de considerações no Twitter contrárias ao uso do medicamento, ainda no domingo 17, quando o Governo do Maranhão anunciou publicamente a mudança no protocolo de tratamento da doença no estado, após vazamento da distribuição de kits de fármacos pela SES (Secretaria de Estado da Saúde) e Emserh (Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares), contendo a cloroquina.

Para Yglésio, conforme já mostrou o ATUAL7, não há evidências científicas de que o uso do medicamento traga benefícios para pacientes infectados pelo novo coronavírus, inclusive para aqueles com casos leves e moderados. A distribuição adotada pela SES sem respaldo da ciência, diz, provocará desobediência às medidas de isolamento social e falsa redução de casos confirmados da Covid-19.

“Medicamento não funciona, mas mesmo assim, uma parte da população vai aumentar o fluxo de procura às unidades. Coincidindo com o fim do lockdown, é mais uma medida que estimula redução do isolamento social. Muita gente vai se considerar imune e somar-se-ão comportamentos de risco. Vai reduzir a pressão por testes, porque muita gente vai achar que não precisa ser testado porque já está tomando a ‘cura mágica’ —falsa subnotificação. Falsa redução dos casos”, publicou.

Ainda segundo o parlamentar, além da falta de estudos que embasem o novo protocolo, o efeito provocado pode ser o contrário do esperado.

“Vai acelerar a retomada da economia em velocidade maior do que deveria, portanto há chance de segunda onda de contágio”, alertou.

Na Assembleia Legislativa, durante a sessão virtual realizada na manhã desta segunda 18, o deputado voltou a criticar a mudança no protocolo pela SES, para uso do medicamento contra a Covid-19.

“Inócuo. O remédio não funciona. Fizeram um debate político em algo que o mundo inteiro, os países desenvolvidos já abandonaram”, declarou.

Sem respaldo científico, governo Dino começa a distribuir cloroquina para pacientes leves com Covid-19
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Estudos nacionais e internacionais não encontraram evidências de que o medicamento reduza os riscos de intubação ou morte de infectados pelo novo coronavírus

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não está mais sozinho em sua defesa inabalável da cloroquina para o tratamento da Covid-19. Apesar de estudos científicos não encontrarem evidências de que o uso do medicamento traga benefícios para pacientes infectados pelo novo coronavírus, inclusive para aqueles com casos leves e moderados, a gestão de Flávio Dino (PCdoB) decidiu ofertar o remédio para tratamento de pacientes leves diagnosticados com a doença.

Segundo anunciado pelo Governo do Maranhão, desde o último dia 12, a SES (Secretaria de Estado da Saúde) mudou o protocolo de atendimento e passou a distribuir a pacientes leves um kit de fármacos que combinam Cloroquina/Hidroxocloroquina, Azitromicina, Ivermectina, corticoide, vitaminas C e D, além de remédios para febre e dores, como paracetamol e dipirona.

Pacientes leves são aqueles que não ficam internados. Mesmo apresentando sintomas da Covid-19 e com comorbidades, são mandados de volta para casa, para tratamento domiciliar.

No Maranhão, a SES recomendou o uso da cloroquina e hidroxicloroquina para tratamento dos pacientes com Covid-19 desde abril, mas apenas para acompanhamento hospitalar. Segundo a única diretriz de atendimento publicada pela SES, pacientes com sintomas respiratórios leves sequer devem ser testados em exame específico para detecção da Covid-19 (PCR ou teste rápido). Apenas casos suspeitos, que se encaixem nos critérios de internação, devem ser testados.

Em tese, isto significa dizer que, com o novo protocolo, pacientes com sintomas gripais que sequer possam estar com Covid-19 agora poderão receber o kit com hidroxicloroquina/cloroquina, o que pode acabar falseando o número real de infectados no estado.

Além disso, em total falta de transparência, tanto o novo protocolo quanto a nova diretriz, que liberam a distribuição do kit, ainda não foram tornados públicos. No site da SES, até o momento, permanece publicada apenas a diretriz anterior, para pacientes hospitalizados com formas graves ou casos críticos da doença.

Também jamais foi publicado qualquer estudo ou análise do Comitê Científico de Prevenção e Combate ao Coronavírus no Maranhão, criado para auxiliar o governador na toma de decisões sobre o enfrentamento à pandemia. Apenas gráficos já foram publicados pela agência de notícias do governo ou pelo próprio Flávio Dino nas redes sociais, mas de análises feitas por pessoas que não fazem parte do comitê científico ou sem qualquer especialidade em infectologia, virologia e epidemiologia.

Apesar do uso e distribuição do medicamento obedecer critérios estabelecidos pela SES, responsável pela montagem dos kits, nas redes sociais, o governador Flávio Dino esquivou-se da responsabilidade de sua própria gestão e, sem entrar em detalhes, atribuiu aos médicos a mudança repentina do protocolo, e apelou para o discurso sobre politicagem e ideologia.

“Reitero o que digo há semanas. No Maranhão, nem governador, nem outro político, nem associação ou similar, prescrevem remédios. Quem decide isso são os MÉDICOS que atendem os pacientes. Tão simples de entender. Menos quando há mera politicagem ou apologia de ideologias delirantes”, publicou.

Kit para Covid-19</strong> Montagem de kit de fármacos que combinam Cloroquina e outros medicamentos, para distribuição para pacientes leves, desmentem Flávio Dino e mostra que mudança de protocolo partiu da própria SES/Emserh
Divulgação/SECAP Kit para Covid-19 Montagem de kit de fármacos que combinam Cloroquina e outros medicamentos, para distribuição para pacientes leves, desmentem Flávio Dino e mostra que mudança de protocolo partiu da própria SES/Emserh

A falta de evidências científicas que respaldem o uso da cloroquina no tratamento da Covid-19, principalmente em casos leves e moderados, provocou a saída de dois ministros da Saúde do governo de Jair Bolsonaro. Médicos, Henrique Mandetta e Nelson Teich eram contra a ampliação do protocolo agora adotado pelo governo Dino.

Em coletivas e entrevistas à imprensa, Mandetta chegou a dizer que o uso de cloroquina em casos leves poderia levar ao aumento de hospitalizações por causa de problemas cardíacos, e Teich, dias antes de pedir demissão, alertou no Twitter que o medicamento tem efeitos colaterais.

Além de não haver indícios de que a droga realmente funcione contra o coronavírus, há também estudos publicados nas melhores revistas científicas do mundo cujos resultados apontam que o uso do fármaco pode causar arritmia cardíaca e levar à parada do coração.

Abaixo, segundo o jornal Folha de S.Paulo e o UOL, os principais estudos sobre uso da cloroquina contra o coronavírus:

Estudo do francês Didier Raoult
Nº de pacientes: incerto / Resultados: Efeito positivo identificado em 20 pacientes. Entretanto, o estudo não foi realizado em duplo-cego, ou seja, não houve comparação com pacientes que receberam placebo. Além disso, seis voluntários que tiveram piora (um deles morreu) foram excluídos do estudo. O periódico que publicou a pesquisa afirmou que o estudo “não atendia aos padrões esperados, especialmente pela falta de explicações dos critérios de inclusão e triagem de pacientes"

Estudo no Amazonas
Nº de pacientes: 81 / Resultado: Benefício discreto no uso da dose baixa. O uso de dose alta aumenta o risco de alteração da frequência cardíaca (arritmia) e pode levar à morte. Pelo menos 11 pacientes do grupo que recebeu alta dose morreram

Estudo Prevent Sênior
Nº de pacientes: 636 / Resultados: inconclusivos. O estudo não tinha autorização do Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa) para ser realizado quando os testes começaram a ser feitos. O estudo tem indícios de fraude. Além disso, a metodologia não correspondia aos padrões de pesquisa internacional e o próprio autor do estudo disse à Folha que a forma como sua pesquisa foi feita impede que sejam tiradas conclusões sobre o uso da cloroquina contra o coronavírus

Estudo americano / publicado na The New England Journal of Medicine
Nº de pacientes: 1.376 / Resultados: O estudo observacional (sem intervenção médica) analisou a administração de hidroxicloroquina sozinha ou associada a azitromicina em pacientes com coronavírus para saber se havia benefício para evitar morte ou intubação. Não houve. Entre os pacientes, 811 receberam hidroxicloroquina e 565 não receberam. No fim do estudo 232 pacientes haviam morrido, 1.025 receberam alta e 119 permaneceram internados. Durante o estudo, 346 pacientes morreram ou foram intubados. Segundo os autores, o resultado indica que não há benefício do uso da cloroquina para evitar intubação ou morte. O Journal of the American Medical Association é um respeitado periódico científico

Estudo americano / publicado na Jama (Journal of the American Medical Association)
Nº de pacientes: 1.438 / Resultados: O estado revelou que não há redução de mortalidade de pessoas infectadas com coronavírus nem quando a cloroquina é associada a azitromicina. Ao contrário, tanto sozinha como quando associada à azitromicina, a cloroquina pode causar problemas no coração. Ao todo, 1.438 pacientes de 25 hospitais nova-iorquinos foram avaliados pelos pesquisadores. A maior parte (59,7%) era formada por homens com 63 anos, em média. Apenas pessoas que estavam internadas há pelo menos 24 horas entre 15 e 28 de março foram consideradas elegíveis para o estudo. O último acompanhamento foi feito em 24 de abril. Os pacientes foram divididos em quatro grupos: o primeiro foi tratado apenas com hidroxicloroquina; o segundo, só com azitromicina; o terceiro, com ambos os medicamentos. Dos que receberam ambos os medicamentos, 15,5% registraram paradas respiratórias e 27,1%, anormalidades nos eletrocardiogramas. A proporção é de 13,7% e 27,3%, respectivamente, entre os pacientes medicados só com hidroxicloroquina; 6,2% e 16,1% entre os que receberam azitromicina; e 6,8% e 14% entre os que não foram medicados com nenhum dos dois. em comparação com os pacientes que não receberam nenhum dos medicamentos, não houve diferenças significativas na mortalidade daqueles que foram tratados com hidroxicloroquina, azitromicina ou ambos. Journal of the American Medical Association um dos principais periódicos médicos do mundo. Isso significa que o estudo, o maior desse tipo já realizado, passou por revisão de outros cientistas não envolvidos nas análises em questão