Endividamento do MA
O endividamento do Estado do Maranhão entre 2015 e 2020
Artigo

Por Eden Jr.*

O avançar do ano não foi capaz de desanuviar o ambiente, ainda dominado pela nefasta pandemia da Covid-19, que vitimou, lastimavelmente, mais de 430 mil concidadãos. Inexoravelmente, a crise sanitária comanda as expectativas, e somente o arrefecimento do novo coronavírus pode fornecer um horizonte mais nítido. Porém, um tema que ganha relevo, tanto no debate nacional quanto no local, é o endividamento público, especialmente no contexto da pandemia em que centenas de bilhões de reais foram disponibilizados, pelos governos, para o enfrentamento dos danos gerados pela chaga. No caso da União, que notadamente buscou recursos extras no mercado para mitigar os estragos, via emissão de títulos públicos, o endividamento foi bastante ampliado, bateu recorde histórico e alcançou 89,3% do PIB (toda riqueza gerada pela nação em um ano) ao final de 2020 – esse índice era de 74,6% no início do ano passado.

Em relação aos estados e municípios, e especialmente em se tratando do Maranhão, a discussão do endividamento se circunscreve mais à esfera política e aos efeitos futuros desse passivo. Isso pois, esses entes subnacionais não precisaram se endividar para enfrentar a pandemia, pelo contrário, receberam transferência fenomenal de recursos da União para tal tarefa. Por aqui, a controvérsia tem se dado pelos sucessivos empréstimos obtidos pelo governo maranhense nos últimos anos, como um recente feito junto ao Banco de Brasília, de R$ 180 milhões, a serem empregados na construção de ponte e pavimentação de rodovias. Contudo, para se dirimir as dúvidas deve-se observar documentos oficiais editados pelo próprio governo do Maranhão: o Demonstrativo da Dívida (DD) e o Balanço Orçamentário (BO).

O Demonstrativo da Dívida do encerramento de 2014 informava que o Maranhão, no início de 2015, tinha Dívida Consolidada Líquida (DCL) de R$ 5,2 bilhões, sendo R$ 3,3 bilhões de empréstimos internos (65% do total de empréstimos), R$ 1,8 bilhão de externos (35% dos empréstimos) e R$ 543 milhões de precatórios vencidos e não pagos (10% da DCL). A DCL correspondia a 51,7% da nossa Receita Corrente Líquida (RCL), então de R$ 10,5 bilhões, o que nos deixava uma larga margem para endividamento, já que o limite legal é atingido quando esse indicador chega a 200%. Ainda em 2014, pagamos R$ 255 milhões de juros da dívida (2,5% da RCL) e R$ 246 milhões de amortização da dívida (2,4% da RCL). O DD do encerramento de 2020 indicava que a DCL chegava a R$ 6,8 bilhões, tínhamos empréstimos internos de R$ 3,5 bilhões (67% do total), externos de R$ 1,8 bilhão (33% do total), precatórios vencidos e não pagos de R$ 1,6 bilhão (24% da DCL) e ainda compromissos de R$ 970 milhões referentes à reestruturação da dívida junto à União. Ao final do ano passado, a DCL atingiu 41,8% da RCL – indicador que nos mantinha confortável quanto à possibilidade de assunção de novas dívidas. Ademais, em 2020, o Maranhão pagou R$ 136 milhões de juros da dívida (0,84% da RCL) e R$ 283 milhões de amortização da dívida (1,7% da RCL).

Diante desse panorama, em relação ao período de 2015 a 2020, pode-se chegar a algumas conclusões: a) a dívida líquida do Maranhão sofreu incremento discreto, de 30%, indo de R$ 5,2 bilhões, para R$ 6,8 bilhões (a inflação nesse intervalo foi de 37%); b) a relação dívida/RCL até passou por redução, de 51,7%, para 41,8% (isso muito em função do aumento significativo de 60% da RCL); c) a composição da carteira entre empréstimos internos e externos experimentou poucas alterações, indo de 65% para 67%, e de 35% para 33%, respectivamente (uma boa notícia, pois quanto mais dívida externa mais a variação do dólar impacta no pagamento dessa); d) a dívida em precatórios vencidos e não pagos elevou-se significativamente (mais de 200%), de R$ 543 milhões, para R$ 1,6 bilhão (número muito ruim, porque são direitos da sociedade que estão bloqueados pelo Estado, causando toda sorte de inconvenientes para o cidadão, e que em anos posteriores terão que ser honrados); e e) os pagamentos de juros e amortização da dívida foram de R$ 255 milhões e R$ 246 milhões, para R$ 136 milhões e R$ 283 milhões, respectivamente (em termos reais e proporcionais à RCL, esses valores até se reduziram, o que pode ser encarado, a priori, como um fato positivo).

Contudo, diante dos tempos incomuns da Covid-19, devem-se fazer dois adendos: a) a RCL estadual foi elevada, atipicamente, em 2020 (R$ 16,3 bilhões) – em 2019 foi de R$ 14,7 bilhões – isso muito em razão das transferências federais para combater a pandemia. Dessa forma, em 2019 (um ano mais típico), a relação dívida/RCL foi de 44,56%, contra 41,8% em 2020 (então, nos anos subsequentes, essa relação deve subir moderadamente); e b) em 2020, por conta do programa de auxílio federal e de decisões judiciais, o Maranhão pagou menos juros e amortização da dívida, tanto é que em 2019 esses gastos foram de R$ 393 milhões (R$ 136 milhões/2020) e R$ 629 milhões (R$ 283 milhões/2020), respectivamente (logo, em anos posteriores, o Maranhão deverá fazer mais esforço financeiro para honrar esses encargos, prejudicando assim a disponibilização de políticas públicas em áreas de saúde, segurança e educação).

Todavia, o que se deve ter em mente é que todo organismo estatal (países, estados e municípios) sempre tem algum nível de endividamento – isso é normal e salutar. O primordial é que as contas públicas sigam uma trajetória de equilíbrio – para que não se afugentem novos credores ou que esses exijam juros mais altos – e, particularmente, que os empreendimentos realizados com os recursos dos empréstimos sejam bem elaborados, eficientes, necessários e dentro do valor de mercado, para que a sociedade possa usufruir de maiores benefícios econômicos e sociais.

*Doutorando em Administração, Mestre em Economia e Economista ([email protected])