O ano de 2021 encerra-se ainda sob a marca da pandemia da Covid-19. A vacinação avança de modo desigual no mundo e no Brasil – aqueles que têm mais recursos obtêm facilmente o imunizante, isso fora os alucinados grupos que, deliberadamente, recusam a vacinação – circunstância que se revela ineficaz, pois parcelas não protegidas podem gerar novas variantes. O caso da nova cepa, a ômicron, é emblemático, porquanto ela se espalha pelo mundo, notadamente na Europa e nos Estados Unidos, causa restrições de mobilidade, o que redunda em mais dificuldades para a recuperação da economia.

No Brasil, após a ampliação da vacinação, verifica-se um declínio na média de vítimas – não obstante as dolorosas 619 mil vidas perdidas –, mas o presidente Bolsonaro segue na sua cruzada insana de colocar em dúvida a eficácia das vacinas. O próprio ministro da Saúde, Queiroga, tem agora, na vacinação de crianças, seu novo teatro para turvar o progresso da imunização. Óbvio é – ou deveria ser –, que sem o controle definitivo do coronavírus, as dúvidas permanecerão rondado as atividades humanas, trazendo para o âmago do cenário, o elemento que mais dificulta a normalização da economia: a incerteza.

Apesar de ainda não se ter números totalmente finalizados, é possível afirmar que a reabilitação da economia brasileira – a propalada “recuperação em V” – ainda não ocorreu em 2021, que deve ter crescido 4,5% – isso depois do tombo de 4,1% em 2020. Vários desafios estão postos, não somente para 2022, como para os anos subsequentes. Uma das questões mais graves é a inflação, que se ampliou em todo o mundo, mas no Brasil está mais severa, devendo atingir mais de 10% em 2021. Os fatores, internos e externos, que levaram ao incremento dos preços foram múltiplos, como a crise hídrica, o aumento da energia elétrica, a elevação internacional dos combustíveis, a escassez de matérias primas, a subida de alguns alimentos e a disparada do dólar – neste caso especialmente pelo permanente clima de conflagração criado pelo próprio Bolsonaro e pela hesitação quanto à consistência das contas públicas brasileiras.

Inflação alta ocasiona corrosão do poder de compra, retração nos negócios, novas remarcações de preços e aumento dos juros básicos da economia – a taxa Selic. O Banco Central, que vem guindando os juros para tentar domar a inflação, elevou a Selic a 9,25% a. a. em dezembro último – o sétimo acréscimo seguido. O BC promete expandir os juros ao nível que seja necessário para domar a escalada dos preços. Se por um lado a majoração da Selic pode ser um remédio para inflação, por outro ela encarece empréstimos e financiamentos, o que obstaculiza a dinamização das vendas e negócios, e da própria economia.

O desemprego vem caindo, e segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) do IBGE, ao final de outubro, 12,1% dos brasileiros em condições de trabalhar estavam sem ocupação – 12,9 milhões de pessoas. Esse é o menor patamar de desocupação desde fevereiro de 2020, mas ainda é maior do que o registrado antes da crise da Covid-19. Porém, apesar da elevação do emprego, a renda média real do trabalhador (descontada a inflação) despencou para R$ 2.449,00 – a menor da série histórica iniciada em 2012. Deve-se notar que o percentual de ocupados na informalidade aumentou, chegando a 40,07% dos trabalhadores. Ou seja, há mais pessoas com ocupação, entretanto, recebendo menos e em postos precários, em que não há estabilidade e demais benefícios, desencorajando o consumo e a possibilidade de recuperação da economia.

As contas públicas progrediram. Segundo o Tesouro Nacional, em novembro, a União registrou um superávit primário – receitas menos despesas, antes do pagamento dos juros da dívida – de 3,87 bilhões. É o melhor resultado para esse mês desde 2013. A arrecadação federal expandiu-se 21,9% em 12 meses. Contudo, no ambiente fiscal, é necessário considerar que: a inflação colaborou com a dilatação da receita, via aumento de preços dos produtos; a alta das comodities, como o petróleo, e a retomada da economia em 2021, também alavancaram o recolhimento de impostos. Essas circunstâncias específicas, provavelmente, não vão se repetir em 2022, o que deve piorar o cenário das contas governamentais.

A precipitação da disputa presidencial, que promete ser severa, lança mais dúvidas. Especialmente pelos dois nomes que devem ser protagonistas da contenda, Bolsonaro e Lula, tenderem para a radicalização e reiteradamente questionarem os fundamentos da responsabilidade fiscal. No panorama internacional, o aumento dos juros na Europa e a sinalização nesse sentido nos EUA pioram a situação do Brasil, porque devem ocorrer: fuga de recursos para esses mercados mais seguros, subida do dólar e da inflação, fato que deve gerar novas rodadas de elevação dos juros internos. Sinais positivos vêm da balança comercial, onde nossas exportações, em 2021, superaram as importações em 61 bilhões de dólares. Porém, em razão da carestia de produtos que exportamos, como ferro e soja, e não do crescimento na quantidade de bens vendidos. A agropecuária deve expandir-se 5% neste ano, depois da queda de 0,5% no ano passado. O setor, que seguidamente tem impulsionado a economia nacional, deve garantir mais uma ajuda, apesar de representar apenas 8% do nosso PIB (soma das riquezas produzidas no país).

As previsões do mais recente Boletim Focus do Banco Central – que reúne as previsões das principais instituições financeiras – lançado em 3 de janeiro, indicam que neste ano a economia vai crescer apenas 0,36%; a inflação vai a 5,03%; os juros ficarão em 11,5% e as contas públicas serão deficitárias em 1,05% do PIB. São perspectivas ruins para 2022, fazendo dele um ano praticamente perdido, em termos econômicos, mas que, todavia, será crucial para o futuro, pois com as eleições pode-se escolher programas políticos que têm capacidade de alterar significativamente – para melhor – o destino do Brasil.

*Doutorando em Administração, Mestre em Economia e Economista ([email protected])


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