Gestão pública, transparência e cidadania participativa

Artigo de Alexandre Antonio Vieira Vale, auditor estadual de controle externo do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão. Especialista em Administração Pública

Gestão pública de qualidade combina com transparência e cidadania participativa. Da sinergia desses três fatores podem emergir soluções para os problemas enfrentados por todos os níveis da administração pública.

Um dos maiores desafios a ser suplantado pela gestão pública moderna é o de construir diálogo sólido e permanente com cada cidadão, que deveria ser beneficiário direto das ações dos Poderes Públicos e que a eles dá sustentação financeira por intermédio dos tributos que paga.

Em tempos marcados por diversas possibilidades comunicativas, com instantânea e ampla circulação das informações; com diversas formas de sociabilidade concretizadas e potencializadas pelas tecnologias da informação, a legitimidade dos atos dos responsáveis pela condução da gestão pública passa pelo aprofundamento dos princípios da transparência e da cidadania participativa.

Mas por transparência na gestão pública não se entende apenas a mera divulgação de dados, muitas vezes restritos aos campos menos sensíveis da administração, com freqüência descontextualizados, escassos, cronologicamente defasados e, em muitos instantes, propositalmente distorcidos. O que os torna incapazes, ainda que publicizados, de permitir raciocínio crítico sobre um contexto específico ou avaliação adequada das políticas públicas em execução.

Acrescente-se a isso o fato de que a transparência na gestão pública, no caso brasileiro e da forma como é operacionalizada, não é resultante de cultura que privilegia, reconhece e cultiva com vigor a difusão abrangente e profusa de informações, mas de um ordenamento jurídico que ainda enfrenta resistências de toda ordem e é objeto de habituais contestações, oriundas de todos os níveis da administração pública.

Ainda não está consolidada em nosso meio a noção primária de que o responsável pela gestão da coisa pública, em qualquer estrato e magnitude, deve satisfações permanentes aos cidadãos, que no caso dos gestores eleitos, lhes conferiram inerente responsabilidade por meio do voto.

Mudar esse quadro é crucial se desejamos que a gestão pública em nosso país tenha elevado padrão qualitativo e consiga implementar medidas efetivas que solucionem ou reduzam a escandalosa desigualdade social; a asquerosa concentração de renda; os gravíssimos problemas que vivenciamos na educação, na saúde, na segurança pública, na infraestrutura, na competitividade de nossa economia, entre outros aspectos. E justamente nesse ponto se encaixa mais um componente dessa equação, que se denomina cidadania participativa.

Hoje, boa parte dos cidadãos brasileiros comporta-se como super-heróis que se esqueceram dos poderes que possuem. E dessa forma seguem, dia após dia, com uma miríade de virtudes, habilidades e competências subaproveitadas.

Com seu trabalho, dedicação, ética e compromisso (e por mais que nos digam o contrário, isso é real, concreto) participam da construção da riqueza, material e simbólica, do país, mas pouco usufruem dos resultados dos seus próprios esforços. Porque esses frutos são expropriados, em muitas ocasiões, por gestores públicos que deveriam ser responsáveis pela promoção do bem-estar social. É necessário resgatar a base dos poderes que temos. Na construção social vigente, esse fundamento chama-se cidadania.

E essa cidadania deve ser ativa, influente, integradora, participativa, crítica; irônica e mordaz, quando necessário, mas sempre orientada pelos princípios da democracia e tendo como finalidade o alcance da justiça social. Cada cidadão pode, dentro das suas circunstâncias e limitações, desbravar espaços de atuação transformadora em sua comunidade, na sua cidade, no país. O desafio é árduo, contudo factível.

Não há vazio de poder. E se esse poder não for exercido por pessoas que defendem princípios republicanos e que têm como meta o bem-estar coletivo, ele o será por aqueles que atuam tendo por norte o enriquecimento ilícito, a dilapidação do patrimônio público, a corrupção como método, a fraude como tática e por estratégia principal a transformação de todos em sujeitos passivos e espectadores de sua atroz hegemonia.

O ano que transcorre tem características especiais para que possamos exigir maior transparência de todos os agentes públicos e participar ativamente da definição dos caminhos que nossa comunidade, estado e país irão percorrer.

O processo eleitoral, considerado por nós com a devida responsabilidade, é uma ferramenta imprescindível da democracia, que se aprimora e produz melhores resultados quando indignação e consciência crítica se aliam para depurar a qualidade daqueles que nos representarão e que serão responsáveis, juntamente com cada um de nós, cidadãos, pela gestão da coisa pública. Até quando nos recusaremos a iniciar o processo de implementação das mudanças que podem contribuir para a construção de um país com mais justiça social?


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *