DURANTE os anos de chumbo do regime comunista polonês era prática corriqueira daquela ditadura colocar a polícia secreta e mesmo a ostensiva no encalço dos homossexuais para documentar sua vida privada e íntima e utilizar aquele material coletado pelo Estado como instrumento de perseguição política, chantagens, achincalhes e até torturas, prisões e mortes.

Eram os chamados “books rosas”, muitos dos quais foram localizados ou se encontram perdidos até hoje com o fim daquele regime.

Um filme em exibição no streaming Netflix trata desse assunto: Entre Frestas.

Antes das agências de modelo ou da Rede Globo popularizarem o nome a expressão book rosa era um instrumento de perseguição a artistas e intelectuais homossexuais na Polônia comunista.

O ideólogo do comunismo, Karl Marx (1818 – 1883), na obra “Dezoito Brumário de Louis Bonaparte”, de 1852, cunhou uma frase que restou imortalizada até hoje: “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”.

Supostamente – digo isso porque negado peremptoriamente pelos envolvidos –, e sem que ninguém se desse conta, a história dos “books rosas” do antigo regime comunista polonês e a frase do comunista Marx se encontraram no nosso velho Maranhão cansado de guerra, até bem pouco tempo comandado no núcleo do poder pelos “bolcheviques”, desta vez como farsa.

Como se recordam, o assunto mais comentado no final de semana passada em todas as “rodas” foi um suposto flagrante de uma guarnição militar em um deputado estadual que supostamente estaria praticando sexo oral em um rapaz, supostamente seu funcionário, em plena orla da capital maranhense.

Primeiro foi distribuída uma notinha anônima de rede social narrando em tons pornográficos o milagre, sem declinar o nome do santo. Lá continha que durante abordagem de rotina o parlamentar fora encontrado – se não me falha a memória o termo utilizado foi flagrado –, fazendo sexo oral no rapaz referido como sendo seu motorista e que na vistoria do veículo foram encontrados dinheiro (três mil reais), uma pasta preta contendo documentos da atividade parlamentar, além alguns cigarros de maconha (atribuídos ao suposto motorista) é um falo de borracha medindo 22cm.

Tendo aguçado a curiosidade geral da plateia, não tardaram a espalhar as fotografias do deputado e de um rapaz, supostamente envolvidos no suposto episódio de “flagrante” narrado na notinha maliciosa anteriormente divulgada.
Muito embora as fotografias não fossem do suposto episódio foi o que bastou para “incendiar” ainda mais os comentários da patuleia afoita por escândalos.

Acho que somente no dia seguinte o deputado supostamente envolvido no suposto episódio denunciou que estaria sendo vítima de uma rede de “fake news” patrocinada pelo governo estadual por conta de sua atividade parlamentar e por ter denunciado supostos esquemas de corrupção de integrantes do governo, bem como, reafirmando pública e desnecessariamente sua orientação sexual, neste ponto sendo contestado pela malta maledicente com a seguinte frase: “não se combate fake news com fake news”.

Pois bem, amigos, o presente texto não trata do suposto episódio de cunho sexual, até porque sexo consensual envolvendo adultos só se torna assunto de “interesse público” nas ditaduras mais tacanhas.

Se o fato tivesse acontecido – ainda que faça alguma observação quanto ao local, a controversa posse de drogas –, este seria um assunto estritamente privado e não interessaria a ninguém, apenas revelando a série de preconceitos ainda existentes na nossa sociedade. Até porque, se fosse uma excelência, nas mesmas condições, “pegando” uma “gostosa” não seria noticia ou, se o fosse, seria para “festejar” a façanha e não para denegrir os supostos envolvidos como fizeram com a exposição pública do deputado e do rapaz, violando-lhes, claramente, princípios constitucionais contidos no artigo 5º da carta, como o direito à intimidade, a vida privada e o direito de imagem.

O que fizeram aqueles cidadãos – e me é indiferente se o fato ocorreu ou não –, foi algo muito grave e que deveria resvalar em uma apuração com o objetivo de encontrar, responsabilizar e punir de forma adequada os envolvidos.
Igualmente grave, para dizer o mínimo, é o fato de um deputado estadual acusar o governo de se encontrar por trás de uma rede de “fake news” para intimidar os adversários – e ou manter sob controle os aliados, ainda mais fazendo uso de instrumentos como a espionagem da vida privada das pessoas para chantagens políticas.

Repare que no caso do deputado, conforme ele próprio denunciou, criaram uma “narrativa” com fatos inverídicos para o chantagear politicamente por contas da sua atuação parlamentar.

Ora, se são capazes de “criar” um fato inexistente com propósito tão escusos o que os impediriam de utilizarem os instrumentos de espionagem para bisbilhotar a vida das pessoas incluindo o que fazem – e com quem fazem –, nas alcovas?

Em sendo verdade o que foi denunciado, fatos “criados” contra um deputado para chantageá-lo e o achincalhá-lo por conta de sua atividade parlamentar, talvez, seja apenas a ponta iceberg de um escândalo político, ético e moral envolvendo o governo estadual atualmente governado por pessoas que sempre se venderam como respeitadoras dos direitos humanos e das garantias constitucionais, pretendendo, o governador, até torna-se imortal da Academia Maranhense de Letras – AML.

A menos que a perseguição seja fruto da inveja, nunca se sabe.

O deputado expôs uma série de perfis de redes sociais falsos que estariam por trás da disseminação de notícias falsas a seu respeito e apontando como sendo “patrono” de tais perfis o governo estadual.

Como a assertiva do deputado não é um pensamento isolado, pois não é de hoje que se ouve “à boca pequena” que os donatários do poder se utilizariam dos legítimos instrumentos de investigação do Estado para construir dossiês contra os cidadãos – adversários ou não –, bem como, não é hoje insinuam que os mesmos “donos do poder” poderiam “acabar” com esse ou aquele adversário em “três tempos”, acredito que o episódio que vítimou o deputado deveria ser melhor investigado.

Muito embora não acompanhe o dia a dia do parlamento estadual, não tenho notícia de que solicitado ou foi determinada qualquer investigação parlamentar com o propósito apurar se o deputado estadual, de fato, foi vítima de uma trama para impedir-lhe de desempenhar com plena liberdade o seu mandato, bem como, se conforme denunciou, tal crime partiu do governo estadual.

Repito, o que ocorreu e o que foi denunciado são fatos graves e que desafiam uma investigação séria e isenta.
Estranhamente ouve-se um estrondoso silêncio na Assembleia Legislativa, no Ministério Público Estadual, na Polícia e na sociedade civil. Como se fosse normal o que aconteceu.

Não é aceitável que em pleno século XXI o Estado ainda se utilize de bisbilhotagem ou crie uma rede de fake news com o propósito de chantagens contra adversários ou aliados, muito menos ainda que tais “bisbilhotagens” recaíam, inclusive, sobre a vida íntima, privada ou sexual dos cidadãos.

Infelizmente, por covardia ou medo, não se ouvem cobranças mais enfáticas por investigações sobre fatos tão graves, repito.

Para fechar o ciclo comunista no Maranhão, que superou de “lavagem” os piores indicadores da antiga oligarquia que reinou por quase meio século, só faltava ressuscitarem os “books rosas” da Polônia comunista.

Segundo dizem, não falta mais.

Abdon Marinho é advogado


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