A pandemia da Covid-19 passa, infelizmente, por nova aceleração, com a média móvel de mortes da última semana aumentando em 53%. A doença, cujo desfecho ainda é incerto, levou à morte mais de 690 mil brasileiros. Em meio à transição para um novo mandato de Lula — o Senado aprovou a “PEC da Transição”, ou do “Estouro Fiscal”, que permite gastos extras superiores a R$ 168 bilhões, e agora segue para a Câmara dos Deputados — dois organismos federais divulgaram estudos com indicadores muito ruins para o Maranhão, especialmente para quem comandou o Estado nos últimos oito anos. O IBGE afirma que em 2021 o Maranhão era a unidade do Brasil com a maior proporção de pessoas vivendo na extrema pobreza. O Tesouro Nacional rebaixou, novamente, a nota fiscal do Maranhão (questão abordada doravante).
Pelo Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais, lançado em 29 de novembro último, o Tesouro Nacional pretende ampliar a transparência, estimular discussões sobre as finanças dos estados e municípios, além de expor dados e análises a respeito de informações fiscais desses entes e anunciar as suas notas de Capacidade de Pagamento (Capag). Na introdução desse Boletim (com dados referentes a 2021), o Tesouro apresenta reflexões relevantes sobre as finanças relativas ao ano passado. Desse trecho, destaca-se que: (i) a situação fiscal agregada dos estados melhorou em 2021 devido à retomada da atividade econômica, fato que permitiu evolução no resultado primário (receita menos despesas, antes do pagamento dos juros da dívida); (ii) essa apuração positiva deve ser entendida com cautela, pois a expansão das receitas é oriunda, também, da elevação de preços de produtos que têm forte participação na arrecadação tributária, e as despesas com pessoal foram comprimidas pela Lei Complementar nº 173/2020, que encerrou seus efeitos em 2021; (iii) a partir de 2022, sobras de caixa vêm sendo usadas para concessões de reajustes do funcionalismo, atos que podem criar desequilíbrios estruturais; e (iv), por outro lado, reformas implementadas nas previdências dos estados (como a do nosso Fepa, feita com muita relutância pelo governo do Maranhão no final do prazo estabelecido pela EC n° 103/2019) vão trazer alívio para as finanças desses entes — embora, diga-se, esta medida terá repercussões benéficas num futuro mais distante.
Quanto à Capag, em artigo de outubro do ano passado, já se alertava que a melhora fiscal experimentada pelo Governo do Maranhão em 2021 (dados de 2020) poderia ser insustentável, por conta, dentre outros fatores: das fartas transferências de recursos federais para combater a pandemia; da elevação, episódica, na arrecadação do ICMS, em razão da inflação aumentar os preços de produtos tributados e da mudança das regras que disciplinam o cálculo da Capag. Não deu outra. Conforme a avaliação atual do Tesouro Nacional, a nova nota da Capag do Maranhão é “C” — a anterior era “B”. A principal e severa implicação desse tombo é que o Maranhão não poderá contrair empréstimos com o aval da União, pois somente estados com qualificações “A” e “B” têm essa chancela. Essa restrição deve reduzir a capacidade de investimento em obras pelo Estado, pois a garantia do Governo Federal em empréstimos é importante para a obtenção dos mesmos, porque quando o tomador não honra a fatura a União paga.
A situação fiscal do Maranhão é tão constrangedora, que dentre as 27 unidades estaduais avaliadas pelo Tesouro somente nós fomos rebaixados. Goiás, Rio de Janeiro e Tocantins até melhoraram suas notas. Conforme a Portaria ME nº 5.623/2022, que trouxe os novos critérios de análise da Capag, três indicadores são considerados: “endividamento”, “poupança corrente” e “liquidez”. Foi neste último, que o Governo do Maranhão obteve a sua pior avaliação, circunstância essa determinante para a queda. Um indicador de “liquidez” ruim, como o nosso, sinaliza que o ente pode ter dificuldade para quitar suas obrigações de curto prazo, pois os recursos em caixa são insuficientes (leia-se atraso de fornecedores).
Adverte-se, como feito em outubro de 2021, que a próxima nota da Capag do Maranhão (de 2023 com dados de 2022), dificilmente deve melhorar, visto que: (i) 2022 é ano eleitoral, no qual a ampliação das despesas com benesses de todas as naturezas é fato recorrente; (ii) os estados perderam arrecadação de ICMS em razão da desoneração de combustíveis, energia elétrica e telecomunicações promovida pelo Governo Federal; e (iii) somente em 2022, a União pagou R$ 440,22 milhões em dívidas não honradas pelo governo maranhense com organismos internacionais — mais cedo ou mais tarde esses valores terão que ser repostos ao Planalto.
O momento é de se pensar numa agenda perdida (ou nunca vista) no Maranhão: a busca pela eficiência dos gastos públicos. Atitude que, necessariamente, inclui: o enxugamento do desmesurado organograma do Estado (que tem dezenas de secretarias e órgãos, vários com competências sobrepostas); a vinculação de parte da remuneração dos servidores ao cumprimento de metas; a permanente avaliação dos programas de governo; a intensiva digitalização dos serviços públicos e a atualização de pontos ultrapassados do estatuto do funcionalismo, como feito na União ainda na década de 1990. Do contrário, a passagem do governo Flávio Dino para o Carlos Brandão será marcada como o de uma verdadeira “herança fiscal maldita”.
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*Doutor em Administração, Mestre em Economia e Economista ([email protected])
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