O tratamento diferenciado dado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) às investigações sobre o suposto recebimento de propina da Odebrecht pelo senador Aécio Neves (PSDB) e pelo governador Flávio Dino (PCdoB) pode livrar o primeiro das barras da Justiça ou retornar o segundo para a Lava Jato — ou até mesmo colocar a maior operação de combate a corrupção no país sob forte suspeita de direcionamento.
Explica-se: tanto na delação a respeito de Dino, quanto de fatos sobre Aécio, os delatores da Odebrecht apontaram o doleiro ‘Tutar’ como o responsável pelo repasse do dinheiro por fora para o tucano e o comunista, em troca de articulações que favorecessem interesses da empreiteira. Ambos negam o recebimento da suposta propina.
O suposto ilícito de Aécio teria ocorrido em 2007, e segue sendo investigado, tendo o caso sido remetido para a instância inferior, nesta semana, em consequência da decisão recente do STF (Supremo Tribunal Federal) que restringiu o foro privilegiado de parlamentares para crimes ocorridos dentro do mandato e ligados ao cargo. Já o caso de Dino se encontra arquivado, em razão do então vice-procurador-geral da República, José Bonifácio de Andrada, haver informado em seu parecer uma dificuldade “praticamente intransponível” de se buscar uma prova autônoma do efetivo pagamento da vantagem indevida, que queria sido obtida “no longínquo 2010”.
Ou seja, apesar do tucano e o comunista, segundo os delatores da Odebrecht, haverem recebido propina da construtora por meio do mesmo operador, e os fatos sobre Aécio terem ocorrido três anos antes do de Dino, os membros do Ministério Público Federal (MPF) na Lava Jato decidiram prosseguir com as investigações contra um, mas relaxar em relação ao outro.
No caso do senador, o acordo de delação premiada em que ‘Tutar’ foi apontado como responsável pelo repasse foi feito pelo então superintendente da Odebrecht em Minas, Sérgio Luiz Neves. Do governador do Maranhão, o depoimento foi feito por José de Carvalho Filho, ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira.
Em ambos, eles explicaram como e o porquê de haverem se aproximado de Aécio Neves e Flávio Dino por orientações de Marcelo Odebrecht, que os repasses foram acertados pelo departamento da empresa responsável pelo pagamento de propinas e caixa dois a políticos, e que não se recordavam de dados mais aprofundados sobre a propina por atuarem apenas na parte das negociações, mas que o dinheiro havia sido operado e entregue pelo doleiro ‘Tutar’.
O inquérito sobre Aécio, por conta da decisão do Supremo em relação ao foro, se encontra aos cuidados da Justiça Criminal Estadual de Primeiro Grau da Comarca de Belo Horizonte, para “regular e livre distribuição”, conforme determinado pelo ministro Alexandre de Moraes, então relator do caso no STF. A sindicância contra Dino, embora se encontre arquivada pelo ministro Felix Fisher, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), recebeu a ressalva de que poderá ser reaberta, caso sejam apresentadas novos indícios de provas da suposta propina.
A descoberta de quem é o doleiro ‘Tutar’, que teve claro tratamento diferenciado nas duas investigações, pode ser utilizada pela força-tarefa da Lava Jato como as “outras provas” que Fisher declarou serem necessárias para a “possibilidade de novas investigações” contra Flávio Dino. A prisão de dezenas de dezenas de doleiro na Operação ‘Câmbio, Desligo’ , inclusive, pode facilitar a reabertura da sindicância contra o comunista. Como ele não é mais deputado federal, os autos seriam remetidos para a República de Curitiba e qualquer decisão caberia ao juiz Sérgio Moro.
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