Brandão renova contratos com empreiteira em nome de laranjas de Eduardo DP
Política

Brandão renova contratos com empreiteira em nome de laranjas de Eduardo DP

Governo do Maranhão já reservou mais de R$ 241,2 milhões para pagamentos à Construservice. Empresa foi alvo da Seccor e do Gaeco por corrupção e desvios de recursos

A Secretaria da Infraestrutura do Maranhão renovou pelo menos dois contratos com uma empreiteira que, segundo investigações da Polícia Civil e do Ministério Público do Estado, é registrada oficialmente em nome de laranjas.

Trata-se da construtora Construservice Empreendimentos e Construções, com sede em Codó, a 300 quilômetros de São Luís.

As duas renovações são referentes a contratos celebrados em 2019, e têm como objeto a execução dos serviços de melhoramento e conservação de rodovias estaduais nas regionais de Santa Inês e de Bacabal, respectivamente. A nova vigência é de 12 meses.

Assinada no dia 17 de outubro, a primeira renovação de contrato, já no sexto aditivo, foi reajustada em quase R$ 17,3 milhões, e agora ultrapassa o valor de R$ 59,2 milhões. A outra, já no sétimo aditivo e reajustada em mais de R$ 21 milhões, foi assinada no dia 21 de novembro, passando a ter o valor de quase R$ 71 milhões.

Pela Sinfra, assinou o secretário adjunto de Administração e Finanças, Marialdo Carvalho Alves, e pela Construservice, o engenheiro civil Rodrigo Gomes Casanova Júnior.

Nos registros da Receita Federal, é Rodrigo Casanova quem atualmente aparece como sócio formal da empreiteira, juntamente com Adilton da Silva Costa.

São as primeiras renovações de contratos com a Construservice pela Sinfra na gestão Carlos Brandão (PSB), que assumiu o Palácio dos Leões em abril, após renúncia de Flávio Dino (PSB). Ele foi reeleito ao governo em primeiro turno nas eleições de 2022, e Dino, eleito ao Senado.

Ambos conseguiram chegar ao Executivo do Estado sob forte discurso em defesa da probidade e se contrapondo aos escândalos de corrupção que levaram seus adversários nas disputas eleitorais à derrota nas urnas.

Entre 2015 e 2022, porém, a Construservice explodiu em verbas públicas na gestão estadual. Até agora, o governo maranhense já reservou mais de R$ 241,2 milhões do Orçamento para pagamentos à empreiteira —o valor total já quitado a ela nos últimos oito anos chega a quase R$ 235 milhões, conforme dados do Portal da Transparência atualizados até esse domingo (4).

Parte desses recursos foi custeado pela Secid (Secretaria de Estado das Cidades e Desenvolvimento Urbano), que celebra contratos com a empreiteira desde 2020. Nos últimos três anos, turbinada por emendas parlamentares, a pasta já reservou mais de R$ 90 milhões para pagamentos à empresa, tendo desembolsado cerca de R$ 68 milhões disso até agora.

Segundo inquéritos relacionados à Máfia da Agiotagem, instaurados a partir de desmembramento das apurações do assassinato do jornalista Décio Sá, em 2012, a empreiteira é controlada por Eduardo José Barros Costa, filho da ex-prefeita de Dom Pedro, Maria Arlene Barros Costa. Conhecido como Eduardo DP ou Imperador, ele é acusado de comandar uma organização criminosa envolvida em corrupção, fraudes em licitações e desvios de recursos públicos em mais de 40 municípios maranhenses.

Alvo de operações nos âmbitos estadual a federal, Eduardo DP chegou a ser preso por mais de uma vez pelo Gaeco (Grupo Especial de Combate a Organizações Criminosas), do Ministério Público, e pela Seccor (Superintendência Estadual de Combate à Corrupção), da Polícia Civil maranhense —mas segue em liberdade.

O ATUAL7 solicitou de Dino e Brandão posicionamento sobre a realidade estigmatizante de corrupção que o Maranhão ainda se depara, exatamente em razão do governo celebrar e manter contratos com empresas alvo de operações da própria Polícia Civil, como a controlada por Eduardo DP por meio de laranjas, mas não obteve resposta.

Procurada, a construtora também não retornou para se manifestar sobre os contratos celebrados com o governo maranhense.

No último dia 20 de julho, Eduardo DP foi alvo da Operação Odoacro, da Polícia Federal, em uma investigação que mira fraudes em licitações e desvios de verbas federais na estatal Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), sob o governo Jair Bolsonaro (PL).

Nessa mais recente estadia no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, de forma incomum, o sócio oculto da Construservice teve a guia de recolhimento registrada quase 24 horas depois de haver sido encaminhado para a cadeia, somente após o ATUAL7 questionar a pasta estadual da Administração Penitenciária sobre possíveis regalias ao preso.

Nas investigações em âmbito estadual, tanto Rodrigo Casanova quanto Adilton Costa, registrados oficialmente, respectivamente, em maio e em dezembro de 2013, como sócios da Construservice, admitiram durante depoimento no bojo da Operação Detonando que foram procurados pelo filho da ex-prefeita de Dom Pedro para compor o quadro societário da construtora —embora não mantivessem qualquer ligação pessoal ou empresarial entre si, segundo afirmaram nas oitivas.

Antes deles, outras pessoas, também apontadas pela Polícia Civil e Ministério Público como laranjas, constaram formalmente como sócias na construtora, que até 23 de janeiro de 2009 se chamava Natluz Comércio e Serviços Elétricos, e tinha endereço cadastral no bairro do Coroadinho, na capital do estado.

Os outros laranjas foram Natalina Carvalho Ferreira, Robert Rodrigues Cantanhede, Wesley de Sousa Ferreira, Jean Pereira dos Santos e Francisco Robert Soares.

Adilton, ainda segundo as apurações, disse em depoimento que trabalha com serviços gerais para a família de Eduardo DP desde 1982, recebendo um salário mínimo, sem carteira assinada.

Além da constante mudança no quadro societário, a construtora também trocou de endereço cadastral por diversas vezes: iniciou as atividades em São Luís, depois mudou-se para Santo Antônio dos Lopes e, por último, para Codó, onde fixou sede. Desde setembro de 2017, tem também uma filial, no município maranhense de Timbiras, segundo informado à Receita Federal.

Apesar de não aparecer nos registros da Construservice, Eduardo DP representou a empreiteira em pelo menos dois atos oficiais do Governo do Maranhão relacionados a contratos celebrados com a Sinfra.

Conforme mostrou o ATUAL7, no dia 25 de novembro de 2017, o sócio oculto da empreiteira esteve, com direito à participação em palanque, na assinatura da ordem de serviço para a execução de pavimentação asfáltica do trecho coincidente MA-008/MA-119, que liga os municípios de Vitorino Freire e Paulo Ramos.

No último dia 2 de junho, cerca de um mês antes de ser preso pela PF na Operação Odoacro, acompanhou os secretários Aparício Bandeira Filho (Sinfra) e Sebastião Madeira (Casa Civil), que representavam Brandão, na comitiva do governo que assinou ordem de serviço e entregou obras nos municípios de Bacabal, Alto Alegre do Maranhão, Coroatá e Codó.

Duas semanas depois, pela oitava vez, a Sinfra aditou um contrato de 2017 com a Construservice, no valor de R$ 82,2 milhões, para execução de serviços de pavimentação e manutenção de vias urbanas nos municípios da regional de Bacabal, com novo prazo de execução e vigência por mais 12 meses.

O ATUAL7 enviou ao Governo do Maranhão questionamentos sobre as razões da celebração de contratos e aditivos com a empreiteira, mesmo após investigações da própria Polícia Civil e do Ministério Público, além da PF, apontarem tratar-se de empresa operada por Eduardo DP em esquema envolvendo laranjas, fraude em licitação, desvio de recursos, lavagem de dinheiro e até agiotagem.

Até o momento, não houve qualquer resposta.

O ATUAL7 também enviou a Eduardo DP perguntas sobre a atuação dele em contratos da Construservice com a gestão estadual, mesmo ele não respondendo formalmente pela empreiteira. Também não houve manifestação.



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