Em uma decisão com atecnia jurídica, o desembargador Jamil Gedeon, da Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Maranhão, suspendeu na quarta-feira (11) a anulação da indicação e nomeação do advogado Daniel Brandão ao TCE (Tribunal de Contas do Estado), embora a sentença que havia apeado o conselheiro do cargo já estivesse integralmente suspensa.
A controversa consta na própria decisão do magistrado, que registrou o fato de que, em razão do processo originário se tratar de uma ação popular e não se enquadrar em exceções da lei, a simples apresentação de recurso em primeira instância –feito registrado no sistema eletrônico do Poder Judiciário maranhense cerca de um dia antes da análise de Gedeon– já suspendia, automaticamente, os efeitos da determinação do juiz Douglas Martins, da Vara de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís.
“Assim, por não se enquadrar em nenhuma das hipóteses previstas no §1º do art. 1.012 do referido diploma legal, o efeito suspensivo, como dito acima, é ope legis, pois decorre automaticamente do texto normativo, não havendo a necessidade de o órgão judicial (no caso, este relator prevento) analisar os pressupostos para sua concessão (probabilidade de provimento do recurso e risco de dano grave ou de difícil reparação)”, escreveu.
“Dito de outra forma, a própria lei se encarrega de estipular, rigidamente, quais recursos têm ou não o efeito suspensivo, e nesta contingência, só cabe ao órgão do judiciário competente (para a realização do exame de admissibilidade do recurso) aplicar a disposição concernente ao recurso interposto, realizando a operação imediata e automática.”
Apesar de toda lição, ao final, Gedeon ignorou a própria fundamentação e decidiu suspender unilateralmente os afeitos da sentença de primeira instância, sob alegação de “evitar quaisquer dúvidas interpretativas e prejuízos” ao conselheiro.
Caberá agora à Segunda Câmara de Direito Público do TJMA, após recebimento dos autos e manifestação das partes e da PGJ (Procuradoria-Geral de Justiça), dar a palavra final sobre o caso. Não há prazo para que isso aconteça. Compõem ainda o colegiado os desembargadores Lourival Serejo e Cleones Cunha, como presidente.
Em tese, Jamil Gedeon poderia se declarar suspeito para analisar o processo, em razão dele possuir um contrato de locação de imóvel com o Estado do Maranhão, réu na ação popular.
A nomeação de Daniel Brandão para a cúpula da corte de Contas maranhense havia sido anulada na última segunda-feira (9) por, segundo entendeu Martins, prática de nepotismo. O conselheiro é sobrinho do governador Carlos Brandão (PSB).
No cargo, que é vitalício, ele tem direito a um salário de mais de R$ 35 mil brutos, além de estabilidade na função, com prerrogativas equiparadas a desembargadores do Tribunal de Justiça. Entre as atribuições estão analisar anualmente as contas prestadas e fiscalizar a aplicação de recursos públicos do governo do tio.
A indicação de Daniel Brandão partiu da Assembleia Legislativa do Maranhão, referendada por 41 dos 42 parlamentares da Casa. Apenas o deputado Fernando Braide (PSD) não participou da votação, ocorrida em fevereiro. Ele entrou no TCE-MA na vaga aberta com a aposentadoria do conselheiro Edmar Cutrim.
Já a nomeação foi assinada pela presidente da Alema, deputada Iracema Vale (PSB), então no exercício do cargo de governadora do Estado. Na ocasião, Carlos Brandão e o vice-governador, Felipe Camarão (PT), cumpriam agenda fora do país.
Pela Constituição, a Assembleia Legislativa tem direito a indicar quatro das sete vagas na contas de Contas, cabendo ao chefe do Executivo apenas nomear o escolhido pelos parlamentares, como foi o caso.
Essa previsão legal foi sustentada pelo Ministério Público em parecer apresentado em setembro no bojo da ação popular, e reforçada pela defesa de Daniel Brandão e pela Assembleia Legislativa, em nota pública assinada pelos 41 parlamentares que indicaram o advogado para o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas maranhense.
O TCE-MA é a 3ª maior corte estadual de contas do Nordeste, e a 10ª do Brasil, por ter sob sua jurisdição 217 prefeituras municipais e a administração direta e indireta do governo do Estado. O órgão julga ainda, com poder para aprovar ou reprovar, as contas dos gestores dos poderes Legislativo e Judiciário. Após análises técnicas, pode também suspender ou liberar licitações e obras em todo o estado.
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