O processo de fiscalização do TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Maranhão que apura as circunstâncias da compra de 70 respiradores pelo governo de Flávio Dino (PSB) está travado desde a 12 de novembro do ano passado.
A investigação foi oficialmente instaurada no final de junho de 2020, sob relatoria do conselheiro-substituto Antônio Blecaute, e está paralisada há mais de 90 dias à espera de parecer do Ministério Público que atua perante a corte. Antes de empacar, já tramitava de forma lenta apesar de envolver recursos destinados ao enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, que já matou mais de 10,6 mil pessoas no estado.
Questionado pelo ATUAL7 ainda em 2021, o MP de Contas respondeu que a demora para se manifestar no caso seria “devido à alta demanda de processos relatados e distribuídos”, e que “o tempo médio para esse envio [de parecer sobre o caso]” seria “de um a dois meses, dependendo da natureza do processo”. O prazo máximo alegado terminou desde dezembro, e a apuração segue sem desfecho por depender da manifestação do Parquet para ser concluída.
De acordo com o setor técnico do TCE-MA, pesquisa de preços feita pela CGU (Controladoria-Geral da União) em abril de 2020, em compras efetuadas por estados e municípios, constatou que o preço médio pago por respirador mecânico foi de R$ 87 mil. O Maranhão, porém, pagou quase R$ 200 mil, em média, por unidade.
A compra foi realizada por dispensa de licitação e custou R$ 9,3 milhões aos cofres públicos, e teve como objetivo atender pacientes internados em leitos públicos de UTI usados para tratamento de pessoas diagnosticadas com Covid-19.
De acordo com a própria gestão Dino, o dinheiro foi pago antecipadamente pela SES (Secretaria de Estado da Infraestrutura), via contrato de rateio celebrado com o Consórcio Nordeste, às empresas HempCare Pharma Representações e Pulsar Development Internacional.
Contudo, nenhum aparelho jamais foi entregue pelas contratadas.
Segundo apurou o Tribunal de Contas maranhense, no primeiro negócio envolvendo os respiradores fantasmas, cerca de R$ 4,9 milhões por 30 aparelhos, o dinheiro foi integralmente pago à HempCare, e até hoje não devolvido aos cofres públicos. Na segunda operação, cerca de R$ 4,3 milhões por 40 aparelhos, houve devolução de parte do recurso desembolsado, mas com prejuízo de quase meio milhão de reais aos cofres públicos do Estado, decorrente de variação cambial, já que a compra junto à empresa Pulsar foi efetivada em Euro.
O titular da SES, Carlos Lula, é ex-advogado eleitoral de Flávio Dino e presidente do Conass, conselho que representa secretarias estaduais de saúde.
Além de omitir a compra dos aparelhos no Portal da Transparência do Governo do Maranhão, dificultando o controle social sobre o dinheiro público, ele tenta ainda a decretação de sigilo do caso e o afastamento da auditora Aline Garreto, responsável no âmbito da corte pelo apontamento de diversas irregularidades na compra dos respiradores.
Em julho do ano passado, o chefe da Secretaria de Fiscalização do TCE-MA, Fábio Alex Melo, reforçou a orientação para que seja instaurada sobre o caso uma tomada de contas especial, tipo de processo que busca quantificar danos ao erário e identificar seus responsáveis, para apurar a gravidade das irregularidades apontadas pela área técnica da corte.
No documento, o chefe da SEFIS recomenda também a rejeição completa do pedido de suspeição levantado por Carlos Lula contra Garreto. Segundo a defesa do titular da SES, ao apontar irregularidades na aquisição dos aparelhos, inclusive superfaturamento, ela teria o objetivo político de “retirar a esquerda da situação política brasileira”, e que, nessa intenção, “não mediria esforços para punir o Estado governado por um representante de partido de esquerda”.
Postagens nas redes sociais feitas pela auditora em 2013, em que critica casos de corrupção descobertos no escândalo do mensalão e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), foram usadas pelos advogados de Lula no pedido de suspeição. Ignorando o fato de que o acompanhamento de contratações pelo poder público não é sigiloso e pode ser supervisionado por qualquer cidadão, os advogados de Lula também alegaram que houve vazamento de informações sobre o processo.
De acordo com Fábio Alex, porém, a argumentação utilizada pela defesa de Carlos Lula “é de um descalabro sem tamanho, que não merece nenhuma consideração”.
“Fundamentar uma suspeição com fulcro em compartilhamentos realizados pela nobre auditora, em 2013, no seu perfil privado do Facebook, é pueril, sem justa causa e inapropriado, uma vez que não maculam a instrução processual. Ademais, publicações em rede sociais não são capazes de imputar parcialidade a atos de instrução, até porque esses não tinham por conteúdo mensagens dirigidas ao gestor público aqui fiscalizado”, destacou.
A compra dos respiradores fantasmas também entrou na mira do Ministério Público Estadual, mas acabou sendo arquivada pelo procurador-geral de Justiça Eduardo Nicolau, após investigação relâmpago, sem justificativa pública plausível.
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