A Operação Sermão aos Peixes, que revelou um megaesquema de corrupção envolvendo políticos e empresários nos governos Roseana Sarney (MDB) e Flávio Dino (PCdoB), completa quatro anos neste sábado 16.
Formada pela Polícia Federal, Ministério Público Federal, CGU (Controladoria-Geral da União) e Receita Federal, a força-tarefa saiu às ruas pela primeira vez em novembro de 2015. De lá para cá, baseada em interceptações telefônicas e análise de transações financeiras e em licitações, mostrou que os titulares da SES (Secretaria de Estado da Saúde) nas duas gestões —Ricardo Murad e Carlos Lula, respectivamente— se envolveram, comandaram e tiveram participação ativa no maior lamaçal de desvio de recursos públicos federais do FNS (Fundo Nacional de Saúde) destinados ao sistema de saúde do Maranhão, aportados ao FES (Fundo Estadual da Saúde).
Apesar da descoberta, apenas Ricardo Murad chegou a ter decretada a prisão preventiva, mas já se encontra solto, e virou réu. Carlos Lula, por sua vez, após rápido —mas confortável— abrigo dado pelo TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, não conseguiu mais se livrar das suspeitas que o cercam e acabou denunciado.
Abaixo, relembre o início da operação e das sete fases já realizadas:
Sermão aos Peixes
Deflagrada pela PF, MPF e CGU na tarde do dia 16 e manhã do dia 17 de novembro de 2015, a Operação Sermão aos Peixes reprimiu suposta organização criminosa especializada em montagem de processos licitatórios e direcionamento das contratações de organizações do chamado terceiro setor. Mais de R$ 1,2 bilhão teria sido desviado por meio do esquema, entre os anos de 2010 e 2013, parte para financiamento de campanhas eleitorais.
Segundo divulgado pela PF à época, nessa primeira fase foram cumpridos 13 mandados de prisão preventiva, 60 mandados de busca e apreensão e 27 mandados de condução coercitiva, além do bloqueio de R$ 100 milhões de contas de empresas envolvidas nos desvios de verbas apontados.
Um dos mandados de condução coercitiva —quando o investigado é levado para depor e liberado em seguida—, e um de busca e apreensão tiveram como alvo Ricardo Murad. A pedido da PF, o MPF se manifestou pela prisão preventiva dele, sob suspeita de ter incinerado provas no quintal de sua própria casa, antes das buscas realizadas pelos agentes federais, mas a Justiça Federal negou.
O nome da operação, Sermão aos Peixes, faz alusão ao sermão do Padre Antônio Vieira que, em 1654, falou sobre como a terra estava corrupta, censurando seus colonos com severidade.
Abscôndito e Voadores
Quase um ano depois, em 16 de outubro de 2016, a PF e a CGU deflagraram, simultaneamente, as operações denominadas Abscôndito e Voadores.
Foram cumpridos 32 mandados judiciais, sendo três de prisão preventiva, 12 de condução coercitiva e 17 de busca e apreensão, além do bloqueio judicial de bens a apreensão e sequestro de uma aeronave.
Na segunda fase da operação, Abscôndito, a investigação mirou a destruição e ocultação de provas, incluindo a venda suspeita de uma aeronave objeto de decisão judicial, após o possível vazamento da Operação Sermão aos Peixe.
Já a terceira fase, Voadores, apurou o desvio de cerca de R$ 36 milhões por meio do desconto de cheques e posterior depósito nas contas de pessoas físicas e jurídicas vinculadas aos envolvidos, incluindo o saque de contas de hospitais da rede pública estadual de saúde.
Segundo as investigações, os recursos teriam sido desviados de três UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e do Hospital do Câncer do Maranhão.
Três empresários foram presos: Emílio Borges Rezende, Péricles Silva Filho e Benedito Silva Carvalho. Eles já haviam sido detidos na primeira fase.
A operação que apura o embaraço à investigação foi denominada Abscôndito, que significa “escondido”, em alusão à ocultação e destruição de provas. Já a Voadores se refere à técnica empregada de desviar recursos públicos por meio de cheques.
Rêmora
Quarta fase da Sermão aos Peixes, a Operação Rêmora foi deflagrada pela PF e CGU no dia 2 de junho de 2017, sendo a primeira a mirar e atingir diretamente o governo Flávio Dino, devido a contratos suspeitos com o IDAC (Instituto de Desenvolvimento e Apoio à Cidadania).
Na ação, realizada em parceria com o MPF e a Receita, a Polícia Federal cumpriu quatro mandados de prisão preventiva, um de prisão temporária e nove de busca e apreensão. Foi determinado ainda o bloqueio judicial e sequestro de bens dos envolvidos, em mais de R$ 12 milhões. Um dos alvos foi o presidente do IDAC, Antônio Augusto Silva Aragão.
Segundo a força-tarefa, a partir da deflagração da primeira fase da Sermão aos Peixes, os agentes federais identificaram que os investigados passaram a fragmentar os saques ‘na tentativa de enganar o Coaf’. O prejuízo ao erário, por meio de saques de R$ 200 mil na boca do caixa e escondidos na cueca por um dos operadores do suposto esquema, supera a ordem de R$ 18 milhões.
Realizada por meio da chamada ação controlada —os investigadores acompanharam, durante 70 dias, em tempo real, todas as transações financeiras da suposta organização criminosa— a operação apreendeu R$ 644 mil em dinheiro vivo e até uma BMW X1.
Foi a partir dessa investigação que a CGU e a PF começaram a apurar indícios de fraude em licitação pelo atual titular da SES, Carlos Lula, em benefício do IDAC.
O nome da operação é uma referência a um trecho do Sermão do Padre Antônio Vieira, que ficou conhecido como o “Sermão aos Peixes”, no qual o Padre toma vários peixes como símbolos dos vícios e corrupção da sociedade. O peixe Rêmora seria pequeno, mas possuiria uma grande força para influenciar os acontecimentos.
Pegadores
Em 17 de novembro de 2017, a PF fez buscas e apreensão em 28 endereços e prendeu 14 investigados —e caçou outros três foragidos— na chamada Operação Pegadores, quinta fase da Sermão aos Peixes.
A investigação, iniciada a partir de revelação de supersalário feita pelo ATUAL7, apontou outros desvios de mais de R$ 18,3 milhões da saúde no início do primeiro governo de Flávio Dino. Entre os endereços alvo, a própria sede da SES; e entre os presos quatro servidores ou ex-servidores da pasta na gestão comunista, como Rosângela Curado.
O dinheiro público, segundo a força-tarefa, era surrupiado por meio da contratação de servidores públicos fantasmas apadrinhados de políticos e uso de empresas de fachada —e bancava mais de 400 funcionários fantasmas, além de namoradas, esposas e amantes. A PF diz que até uma sorveteria ‘da noite para o dia’ passou por uma transformação jurídica e virou empresa gestora de serviços hospitalares para emissão de notas fiscais frias e desvios de R$ 1,2 milhão em recursos públicos.
À época, o balanço da Pegadores indicou que foram apreendidos cinco veículos (duas SW4 , uma Blaze, uma Hilux e um Corolla), além de US$ 3.758 em dinheiro.
Lenijane Rodrigues da Silva Lima, à época lotada no cargo de assessora técnica da Subsecretaria da SES, e cunhada do hoje deputado federal Márcio Jerry (PCdoB), foi apontada pela PF como uma das integrantes da suposta Orcrim.
O nome da operação é uma referência a um trecho do sermão do Padre Antônio Vieira. Um dos peixes ele chamou de PEGADOR: referência aos vícios do oportunismo: “vivem na dependência dos grandes, morrem com eles”. Durante a investigação, restou comprovada a prática habitual de desvio de verbas para o pagamento a apadrinhados políticos: pessoas que recebem dinheiro público sem a devida contraprestação laboral, ou seja, atuando como pegadores, na visão do Sermão, já que recebiam tais benesses em razão da influência de pessoas importantes na política local, como já alertava o Padre Antonio Vieira no Sermão aos Peixes.
Peixe de Tobias e Abscôndito II
No dia 18 de outubro de 2018, simultaneamente, a PF deflagrou as operações Peixe de Tobias e Abscôndito II, mais recentes fases da Sermão aos Peixes.
Durante a ação, que contou com a participação da CGU e da Receita Federal, agentes policiais cumpriram oito mandados de prisão temporária, um de prisão preventiva e 19 mandados de busca e apreensão. Entre os alvos estavam o advogado Ravik Barros, o deputado estadual Antônio Pereira (DEM), que já até virou réu, e Ricardo Murad.
As apurações feitas no âmbito da Peixe de Tobias levantaram suspeitas de que, entre os anos de 2011 e 2013, cerca de R$ 2 milhões destinados ao sistema de saúde estadual teriam sido desviados para uma empresa com sede em Imperatriz. A quantia teria beneficiado ainda um grupo de blogueiros, que estaria sendo pago mensalmente.
Além disso, violando medidas cautelares impostas pelo TRF-1, um dos investigados teria dilapidado seu patrimônio e transferido seus bens para terceiros com o objetivo de impedir que fosse decretada a perda.
Já a Abscôndito II mirou o vazamento de informações relacionadas à Sermão aos Peixes. Segundo a PF, os suspeitos cooptaram servidores públicos para obter dados sobre o andamento da investigação.
Os nomes escolhidos para as duas fases também são uma referência a um dos trechos dos Sermões, do padre Antônio Vieira. Conforme o discurso, a bílis do Peixe de Tobias, embora pouco palatável, tinha capacidade de curar a cegueira dos ouvintes. No contexto da investigação, o Peixe de Tobias busca revelar parte da trama delitiva que envolveu o desvio de recursos públicos. Continuidade da Operação Abscôndito, que foi iniciada em outubro de 2016, a Abscôndito II remonta a um trecho dos Sermões que postula que, quanto maiores os peixes, mais se escondem. Trata-se de uma alusão aos atos de ocultação de provas e de patrimônio.
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