Um das principais vidraças do deputado federal e candidato a prefeito de São Luís Eduardo Braide (Pode), o inquérito sigiloso instaurado pela Polícia Federal que o classifica como investigado pode subir para o STF (Supremo Tribunal Federal) ou descer para o Tribunal de Justiça do Maranhão.
A discussão se arrasta no TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região desde o ano passado. A decisão se cabe ou não prerrogativa de foro privilegiado, instituto especial criado para que autoridades respondam por supostos crimes cometidos em razão do cargo e durante a vigência do mandato ou da função pública, está sob responsabilidade do desembargador federal Olindo Menezes, da Segunda Seção do TRF-1, registrado sob o número 0058214-57.2016.4.01.0000.
Segundo a PRR (Procuradoria Regional da República) da 1ª Região, o inquérito sigiloso 0969/2016-DPF/MA apura suposta “apropriação indevida de recursos públicos”. A investigação é baseada em movimentações financeiras atípicas envolvendo quatro sociedades empresárias e o parlamentar, à época deputado estadual. Por conta da vultuosa movimentação financeira das empresas estar relacionada ao dispêndio de recursos públicos de diversos municípios maranhenses, há suspeitas de lavagem de dinheiro e crime de responsabilidade.
Apesar de Eduardo Braide sempre apontar a investigação como invenção de adversários criada por conta das eleições municipais, o inquérito foi instaurado pela Polícia Federal a partir de uma notícia crime de 2014, quando ele sequer era pré-candidato ao Palácio de La Ravardière.
Além disso, certidões de nada consta expedidas pela PF e pelo TRF-1, apresentadas pelo deputado candidato durante o período eleitoral e em processos cíveis e criminais que move contra a imprensa, que em nome da transparência e do interesse público divulga a informação, não servem como prova de que o inquérito não exista ou que seja de conteúdo falso. Isto ocorre porque a pesquisa nos bancos de dados para a emissão das certidões é feita apenas em relação a processos abertos, excetuando-se sigilosos para evitar embaraços às investigações.
Entenda a seguir os detalhes do inquérito, as perguntas ainda sem respostas e confira a checagem do ATUAL7 em declarações de Eduardo Braide.
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O que está sendo investigado?
A PRR-1 e a PF apuram o envolvimento de Eduardo Braide com suposta organização criminosa que teria desviado recursos públicos em diversos municípios do Maranhão, em mais de R$ 25 milhões, quando ele exercia o primeiro mandato de deputado estadual na Assembleia Legislativa. Uma das prefeituras, a de Anajatuba, foi alvo da Operação Attalea, deflagrada em 2014, por participação no esquema criminoso.
Diversos outros municípios são citados no bojo do inquérito por suposto envolvimento com os fatos apurados. Até o momento, porém, nenhum deles foi alvo de operação da PF relacionada ao caso.
Qual a origem da investigação?
A apuração começou em fevereiro de 2014, após o envio à PRR-1 do RIF (Relatório de Inteligência Financeira) 11595 pelo antigo COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) —rebatizado de UIF (Unidade de Inteligência Financeira) no governo de Jair Bolsonaro (sem partido). No documento, encaminhado à procuradora da República Raquel Branquinho, constam informações sobre movimentações financeiras atípicas envolvendo, dentre outros, Eduardo Braide.
Após procedimentos iniciais, os autos chegaram oficialmente ao TRF-1, já como o inquérito policial 0969/2016-DPF/MA, em setembro de 2016.
Conforme o Memorando nº 017/2015-PJR/SR/DPF/MA, assinado pelo delegado da PF Francisco Albuquerque Parente Júnior, em 14 de maio de 2015, em resposta ofício da Notícia Crime sob protocolo 08310.002905/2014-36 encaminhado pela procuradora da República Valquíria Oliveira Quixada Nunes, a investigação tem relação com o inquérito policial nº 452/2014-SR/DPF/MA, sob presidência do delegado Ronildo Ribeiro, que investiga esquema de corrupção na Prefeitura de Anajatuba. Após a deflagração da Operação Attalea, o caso ficou conhecido no Maranhão como Máfia de Anajatuba.
Protagonista em 2014 da primeira reportagem de Eduardo Faustini para o quadro “Cadê o dinheiro que tava aqui?”, do Fantástico, Rede Globo, a corrupção em Anajatuba botou na cadeia o ex-prefeito do município e aliado de Eduardo Braide, Helder Aragão (MDB) —que em 2020 tenta retornar ao comando da prefeitura.
Quem são os investigados?
São alvos do inquérito o deputado Eduardo Braide e as empresas Vieira e Bezerra Ltda - ME, A.J.F Júnior Batista Vieira - ME, Escutec - Pesquisas de Mercado e de Opinião Pública Ltda e A4 Serviços e Entretenimento Ltda.
Embora diversas outras pessoas físicas e jurídicas sejam citadas no relatório do COAF, com base em reportagens da imprensa, a investigação foi concentrada apenas nas empresas e em Eduardo Braide, este último em razão de Matilde Sodré Coqueiro, que aparece em várias operações em espécie tituladas por essas sociedades empresarias, além de ser empregada em duas das empresas investigadas, também aparecer ocupando cargo em comissão na Assembleia Legislativa do Maranhão, por designação de Eduardo Braide. Vendedor de notas frias e um dos cabeças da Orcrim, Fabiano de Carvalho Bezerra também ocupou cargo em comissão na Alema por designação de Eduardo Braide e, anteriormente, de seu pai, o ex-presidente da Casa, Carlos Braide. Na Alema, ele embolsou mais de R$ 840 mil, entre 2008 e 2014.
Quais os possíveis crimes apontados pelos investigadores?
Desvio de recursos públicos, lavagem de dinheiro e crime de responsabilidade.
Quais perguntas ainda estão sem resposta?
1. Por qual motivo Eduardo Braide ainda não foi ouvido no bojo do inquérito, conforme diligência inicial sugerida à Superintendência Regional da PF no Maranhão, desde 17 de março de 2014, pela procuradora da República Valquíria Oliveira Quixada Nunes?
2. Qual entrave da PF, PRR-1 e TRF-1 para concluir o inquérito e denunciar supostos envolvidos ou arquivá-lo por falta de provas?
3. Na movimentação financeira atípica de Eduardo Braide, capturada pelo COAF, consta alguma transação bancária entre as empresas investigadas e Eduardo Braide?
4. Foram instaurados inquéritos paralelos para investigar as outras pessoas físicas e jurídicas citadas no RIF do COAF?
5. A investigação encontrou alguma relação com o mandato de deputado federal Eduardo Braide para justificar a permanência no inquérito no TRF-1 ou ter chegado a decidir que o remeteria ao STF?
6. O que a Polícia Federal descobriu a partir da quebra de sigilo 0017918-22.2018.4.01.0000/MA, no bojo do inquérito 0969/2016-DPF/MA?
7. Porque Eduardo Braide diz que não é investigado se ele já constituiu defesa no inquérito 0969/2016-DPF/MA?
Eduardo Braide deu declarações falsas sobre o inquérito?
Sim! Assim como no pleito de 2016, nas eleições de 2020 o candidato tem novamente exibido certidões da Polícia Federal e do Tribunal Regional da Federal da 1ª Região que mostram que nada consta contra ele, e com isso afirmado que não é nem nunca foi investigado.
“Meus adversários tentam enganar você dizendo que sou investigado. essa é a mesma mentira que usaram na eleição de 2016. Reafirmo para você: não sou investigado”, disse em recente propaganda eleitoral custeada com recursos públicos de fundo.
“A verdade está aqui nesse documento da Polícia Federal, emitido sexta-feira, 6 de novembro de 2020. Além disso, tenho aqui também a certidão do Tribunal Regional Federal, que mostra o meu nome e o ‘nada consta’. Isso quer dizer que não existe nenhuma investigação contra mim. Zero!”, acrescentou.
Ocorre que esses certidões são emitidas apenas com base em investigações que não estão sob sigilo, o que não é o caso do inquérito que apura o envolvimento de Braide e quatro empresas que atuação na Máfia de Anajatuba. Além disto, a certidão de nada consta da PF, por exemplo, trata de busca sobre casos de indiciamento, não de investigação. As figuras indiciado e investigado são distintas na esfera criminal.
O próprio Eduardo Braide, pelo menos desde o ano passado, tem conhecimento pleno de que está dando declarações falsas e que o inquérito está em conclusão para decisão/despacho do desembargador Olindo Menezes, com última movimentação registrada nesta quinta-feira 12. Isto porque, em setembro do ano passado, ele assinou uma procuração Ad Judicia em que outorga a quatro advogados do escritório Cavalcante de Alencar Advogados Associados poderes para atuar no inquérito policial 0969/2016-DPF/MA, referente ao processo 058214-57.2016.4.01.0000, que tramita no TRF-1.
Na movimentação processual no site da Corte, inclusive, por conta do sigilo, o nome de Eduardo Braide e demais investigados não é mostrado (daí o porquê das certidões de nada consta, como já explicado). Na guia Petições, porém, há o registro de entrada do dia 17 de setembro do ano passado de embargos de declaração identificados como E S B, iniciais do nome completo do deputado candidato, Eduardo Salim Braide.
Outro lado
Procurado pelo ATUAL7 por meio de sua assessoria, o deputado federal e candidato a prefeito de São Luís Eduardo Braide não retornou os e-mails, ligações e mensagens insistentemente feitas, desde o ano passado e novamente neste ano, para que explicasse as declarações de que não é nem nunca foi investigado —ditas, inclusive, em processos contra profissionais de imprensa que tramitam na Justiça do Maranhão no TRE (Tribunal Regional Eleitoral)—, se ele próprio constituiu defesa no processo 058214-57.2016.4.01.0000, relacionado ao inquérito policial 0969/2016-DPF/MA.
Por telefone, Fernando Júnior, o sócio proprietário da Escutec, que aparece no relatório financeiro do COAF e também é alvo do inquérito na PF, repetiu Braide, e disse ao ATUAL7 que a empresa “nunca foi citada, ouvida, investigada ou auditada pela Receita Federal”.
“O COAF comunicou a movimentação atípica de várias empresas, inclusive da Escutec. Só que isso não resultou no indiciamento da empresa, e não fomos citados em nenhuma investigação. A empresa tem a contabilidade dela em dia”, declarou.
Os demais investigados não foram encontrados pelo ATUAL7.